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AMBIGUIDADE EM TENSO TERROR PSICOLÓGICO

O desfecho carece de envergadura frente ao que se estabeleceu como diálogo com o espectador.
Por Rodrigo Zavala
Nada menos do que surpreendente pode ser dito do primeiro longa do diretor e roteirista americano Robert Eggers, “A Bruxa”. Com baixo orçamento, mas um imenso rigor e capacidade de criar tensão, realiza-se aqui um terror ambíguo entre paranoia e o sobrenatural, nos confins de uma Nova Inglaterra (EUA) do início do século 17.
De uma forma bastante direta, Eggers constrói seu cenário com a segurança de quem já passou por uma série de curtas no desenho de produção e figurino. Uma família protestante inglesa, em meio ao caos do novo continente americano, é banida por motivações religiosas aos limites do que é conhecido até então.
Uma terra em que nada prospera, costeada por um bosque em que tudo pode dar errado.
Já de início, diante dos olhos da adolescente Thomasin (Anya Taylor-Joy), o bebê da família é levado. Parece que existe uma criatura maligna nos arredores, e o diretor se amarra na imagem de bruxa da idade média, universalizada pelos irmãos Grimm, sedentas por crianças. Mas a narrativa não é tão óbvia.
Na estilizada atmosfera de mistério criada pelo cineasta, em um vigoroso trabalho de época, o sequestro da criança é o estopim para o declínio na histeria e na loucura desta família.
Impotentes frente aos fatos, pouco importam as buscas empreendidas pelo pai William (Ralph Ineson,), que credita a responsabilidade do sumiço da criança a um lobo, ou as súplicas religiosas da mãe Katherine (Kate Dickie).
Thomasin, por outro lado, sobre quem recai a suspeição de negligência, começa a estranhar as atitudes dos três irmãos restantes. Em especial, dos gêmeos Mercy (Ellie Grainger) e Jonas (Lucas Dawson). Embora acreditem que a irmã seja títere do demônio, são eles que conversam com um bode preto, a quem denominam Black Phillip, figura animalesca vinculada universalmente ao diabo.
O fervor religioso da família, colocada à prova, torna o filme um suspense em que a bruxa em si é mero símbolo. A paranoia para encontrar culpados, aqui representada por Thomasin, lembra os julgamentos de Salem, que ocorreriam décadas mais tarde. A fé como poder e o poder como arma da condenação.
Por esses elementos, o filme parece trazer referências de “As Bruxas de Salem”, de Nicholas Hytner (1996), mas molda sua estrutura bebendo também de “A Fita Branca”, de Michael Haneke (2009) e “O Iluminado”, de Stanley Kubrick (1980), esta última assumida pelo diretor nos festivais em que passou, como o de Sundance, onde recebeu o prêmio de direção em 2015.
O desfecho, muito menos solene do que todo o desenvolvimento da narrativa, carece de envergadura frente ao que se estabeleceu como diálogo com o espectador. Eggers brinca com a trilha sonora, cenografia e fotografia para nos levar diretamente à idade das trevas da ignorância com fé, sem esquecer da construção do terror na forma sobrenatural.
Reuters

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