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Encontro de escritores negros na Feira do Livro coloca em debate a representatividade em eventos literários

Encontro de escritores negros na Feira do Livro coloca em debate a representatividade em eventos literários Carlos Macedo/Agencia RBSMuito antes de a Feira do Livro tomar a Praça da Alfândega, uma presença (ou ausência) na programação já era debatida em artigos de jornal e na internet. A inclusão de autores negros na agenda de debates foi tema de textos em Zero Hora e nas redes sociais entre julho e agosto deste ano. Mais tarde, a Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL) confirmou a presença de atrações como o mineiro Ricardo Aleixo, a cubana Teresa Cárdenas e a sul-africana Futhi Ntshingila. A escolha de três destaques do debate sobre literatura e preconceito teria sido uma reação às discussões?

– De forma alguma. Sempre estivemos sensíveis a esse tema. Desde o início do ano estávamos negociando a vinda de autores como Futhi. Há uma preocupação constante em trazer a literatura que está fora dos cânones, dar espaço a vozes diferentes, independentemente da cor – afirma Jussara Rodrigues, responsável pela programação adulta do evento.

Para muitos escritores negros, a discussão está longe de ser esgotada – e é preciso lutar para garantir espaço. Nesta quinta, às 19h, na Sala Oeste do Santander Cultural, um debate sobre literatura e mercado editorial é tema do 2º Encontro de Escritores Negros do Rio Grande do Sul, que integra a programação da Feira. 

– Há uma presença maior de autores negros na Feira neste ano, mas é uma presença exigida, requerida, não é algo naturalizado. O movimento não pode achar que isso é uma garantia já conquistada – avalia a poeta Lilian Rocha, que participará do debate.

O poeta Ronald Augusto apontou em artigo no caderno DOC, de ZH, a falta de representantes da literatura negra em eventos literários, pedindo que "a 62ª Feira do Livro de Porto Alegre nos apresente uma posição" – uma discussão semelhante havia ocorrido anteriormente na 14ª Flip, entre 29 de junho e 3 de julho. 

– É um processo em que é preciso forçar, buscar espaço. Essa perspectiva de que a qualidade dos autores vai resolver tudo, de que a literatura boa vai estar presente nos eventos independentemente da cor, é falaciosa. Esse mito da qualidade somente atrasa a discussão – afirma Ronald.

O escritor Jeferson Tenório, que também publicou artigo sobre o tema em agosto, acredita que a Feira do Livro e outros eventos ainda precisam avançar muito em termos de representatividade:

– Houve um aumento de escritores negros nesta edição da Feira, mas não se trata de um aumento tão significativo como poderia. Além disso, os escritores são, na maior parte das vezes, chamados para falar sobre literatura negra e identidade, ou seja, ficam confinados a um tema. É preciso que a presença de autores negros seja naturalizada, que sejam chamados para falar de questões gerais, bem como para mediar debates.

Segundo Jussara Rodrigues, a programação espelha os debates e as demandas da sociedade:

– Minha resposta para essa discussão sempre foi a mesma: estamos abertos para receber propostas de debates e convidados. Neste ano, os escritores negros se movimentaram bastante nesse sentido, o que enriqueceu muito a Feira. 

Em entrevista a ZH, a cubana Teresa Cárdenas, que esteve na terça-feira na Praça da Alfândega, questionou a falta de homenageados negros no evento:

– Em todos esses anos, vocês só tiveram cinco mulheres como patrona. Alguma era negra? E, entre os homens, algum era negro?

Quem responde é Ronald Augusto:

– Não. É uma pena que o poeta Oliveira Silveira (1941 – 2009) não ocupou o posto de patrono. É uma prova de que a meritocracia não funciona como se diz no Brasil. Temos muito a avançar.

2º Encontro de Escritores Negros do Rio Grande do Sul
Nesta quinta, às 19h, na Sala Oeste do Santander Cultural. Com a presença de Lilian Rocha, Luiz Maurício Azevedo e Vladimir Rodrigues. Mediação de Oscar Henrique Cardoso.

Zero Hora

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