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Beatificação de Paulo VI, o Papa do Vaticano II


Dom Helder conversa com crianças numa favela do Rio de. Janeiro acompanhado pelo então cardeal, Montini, futuro papa Paulo VI
Padre Geovane Saraiva*
Há 51 anos, Giovanni Battista Montini assumiu o comando da Igreja Católica (21/06/1963–06/08/1978), escolhendo o nome de Paulo VI. Quando assumiu o papado, a Igreja vivia uma fase de efervescência causada pelo Concílio Vaticano II, que encaminhava para a segunda sessão, à qual ele deu continuidade, feliz iniciativa da Papa João XXIII, que prosseguiu de 1964 e 1965, concluindo-o em 08 de dezembro de 1965.

O novo Sumo Pontífice apresentou-se ao mundo como um homem progressista, encarregado de colocar em prática algumas das mais ousadas reformas na História da Igreja, sobretudo, a reforma da Liturgia, quando os idiomas nacionais substituíram o latim na celebração do culto. Também o domínio de seis séculos dos italianos no Sacro Colégio de Cardeais teve fim, com uma escolha internacional e um novo espírito de discussão que se delineou e foram postos, em questão, práticas adotadas e aceitas, sem contestação durante longo tempo.

A partir da reiteração da posição católica contra o controle da natalidade, em 1968, Paulo VI intensificou sua preocupação com a preservação da ortodoxia e da doutrina . Aqui se tratou de um papa sábio, de um profundo rigor intelectual, avançado e progressista, mas quando era para se transformar em prática a teoria, seu passado no corpo diplomático do Vaticano falou mais alto, tornando-o mais reservado ante as implicações consequentes das mudanças.

Na primeira parte de seu pontificado, Paulo VI encantou o mundo percorrendo as casas miseráveis de Bombaim, beijando o solo colombiano, por ocasião da 2ª Conferência dos Bispos da América Latina em Medellín, dirigindo-se às Nações Unidas num dramático apelo de paz, visitando também o interior da África e  da Ásia. Desde sua viagem em 1970 à Ásia e ao Sul do Pacífico, o Romano Pontífice não saiu mais da Itália.

Jamais iremos esquecer as palavras sábias e proféticas, da emblemática Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi (08/12/1975), dirigida aos bispos do mundo inteiro, ao clero, aos fiéis de toda a Igreja, sobre a evangelização no mundo contemporâneo: "O empenho em anunciar o Evangelho aos homens do nosso tempo, animados pela esperança, mas ao mesmo tempo torturados muitas vezes pelo medo e pela angústia, é sem dúvida alguma um serviço prestado à comunidade dos cristãos, bem como a toda a humanidade". Giovanni Montini nos aponta para o inesgotável manancial, no desejo de externar o Vaticano II, que são as suas Encíclicas, a saber: Ecclesiam Suam (06 de agosto 1964); Mense Maio (29 de abril 1965); Mysterium Fidei (03 de setembro 1965); Christi Matri (15 de setembro 1966); Populorum Progressio (26 de março 1967); Sacerdotalis Caelibatus (24 de junho 1967); Humanae Vitae (25 de julho 1968).

Veja, estimado leitor, o que disse o Papa Francisco a seu respeito: "Nós, neste tempo, podemos dizer as mesmas coisas que Paulo VI: a Igreja é serva do homem, a Igreja crê em Cristo que veio na carne e por isso serve ao homem, ama o homem, crê no homem. Essa é a inspiração do grande Paulo VI. Caros amigos, reencontrar-nos em nome do venerável Servo de Deus Paulo VI nos faz bem! O seu testemunho alimenta em nós a chama do amor a Cristo, do amor à Igreja, do impulso a anunciar o Evangelho ao homem de hoje, com misericórdia, com paciência, com coragem".

Os quinze anos do pontificado de Giovanni Montini, para ser realista, foram marcados por muito trabalho, desafios, dificuldades, incompreensões e calúnias. Quando eu era seminarista menor em Campo Mourão - PR, no ano de 1976, li um artigo na Folha de Londrina, no qual o diplomata e escritor francês Roger Peyrefitte (1907 – 2000), aluno de colégios internos de jesuítas e lazaristas, formado em línguas e literatura, acusava o saudoso Vigário de Cristo na Terra, com palavras e infâmias, como o homossexualismo, no que provocaram comentários cheios de dolorosa e profunda tristeza. Nada foi comprovado a esse respeito.

Apesar de tudo, os ataques continuaram contra a sua autoridade e sua política de bem governar a Igreja, por parte de elementos descontentes, como a Igreja era conduzida. O semanário italiano Tempo publicou, em determinada ocasião, na capa de um de seus últimos números, uma caricatura do papa, com uma pílula anticoncepcional entre os joelhos – método que, segundo uma piada, é o único aceito pelos católicos – e, de acordo com a revista, a reação de Paulo VI às ameaças de cisma é deixai afastar-se de mim as criancinhas (cf. AP.FL- agosto de 1976).

Deus nos dê a graça do discernimento para que melhor possamos compreender a Igreja do Vaticano II, pela qual Paulo VI, generosamente, doou quinze anos de sua vida, na qualidade de Sucessor de Pedro, beatificado pelo Papa Francisco aos 19/10/2014. Gosto sempre de repetir Dom Aloísio Lorscheider quando o assunto é o referido Concílio: “O Vaticano II faz-nos passar de uma Igreja Instituição, de uma Igreja sociedade perfeita para uma Igreja comunidade, inserida no mundo, a serviço do reino de Deus; de uma Igreja poder para uma Igreja pobre, despojada, peregrina; de uma Igreja autoridade para uma Igreja serva, servidora, ministerial; de uma Igreja piramidal para uma Igreja-povo; de uma Igreja pura e sem mancha para uma Igreja santa e pecadora, sempre necessitada de conversão, de reforma; de uma Igreja-cristandade para uma Igreja-missão, uma Igreja toda missionária”.

*Padre da Arquidiocese de Fortaleza, escritor, colunista, blogueiro, membro da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza, da Academia de Letras dos Municípios do Estado Ceará (ALMECE) e Vice-Presidente da Previdência Sacerdotal - Pároco de Santo Afonso -geovanesaraiva@gmail.com

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