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O AMIGO ATEÍSTA

Os arredores de minha cidade são um excelente laboratório para a troca ideias e experiências.
Bart, como ele próprio diz, da terceira geração de ateístas de sua família.
Por Lev Chaim*
Entre água e árvores, os arredores de minha cidade são um excelente laboratório para a troca ideias e experiências, como também, é claro, para deixar os cães soltos para as necessidades do dia. Nessa hora, os donos dos animais se encontram e conversam.
Naquela tarde caminhava com o meu amigo ateísta, Bart, como ele próprio diz, da terceira geração de ateístas de sua família. Só para terem uma ideia da personalidade deste amigo, cito aqui uma frase que ele sempre repete para tentar me tirar do prumo. É uma citação do intelectual fundador da União Secularizada Britânica, George W. Foote (1850-1915): “As mulheres ainda sentirão orgulho por não terem jamais contribuído uma linha sequer na redação da Bíblia”.
E por isto mesmo é que me senti livre para comentar com ele um assunto que havia lido e achado admirável e inovador, em se tratando de Europa. Uma empresa britânica (Coexist), da cidade de Bristol, a primeira do Continente Europeu, com 17 mulheres e sete homens, e na presidência uma mulher, Bex Baxter, optou por adotar ‘a licença menstruação’ para as trabalhadoras que a necessitarem, em seus primeiros dias daquele período.
Nem bem acabei de falar e Bart virou-se espantado e com a voz um pouco alterada disse: “Ficou louco? Isto é discriminação contra a mulher e, também, vai totalmente contra a política de anos para a emancipação da mesma! Isto é simplesmente loucura de aventureiros!”
Argumentei em seguida: “Pois é Bart, a própria diretora desta empresa falou que já esperava por essas críticas e as refutou ressaltando que é importante reconhecer que a mulher, biologicamente, é diferente do homem. Além do que, disse ela, isto as ajuda a trabalhar de forma mais produtiva”. E sem dar-lhe tempo de retrucar, continuei: “Esta medida, segundo o que li, já havia sido adotada com sucesso pela Nike norte-americana e por algumas empresas asiáticas.”
Ressaltei ainda que a própria diretora da empresa havia dito, em alto e bom som que, muitas vezes, no início da menstruação, ela preferia ficar um ou dois dias em casa, com uma bolsa de água quente sobre a barriga. Até então, todas vinham trabalhar, apesar de não se sentirem nada produtivas, e não podiam fazer nada, pois menstruação não era justificava para a ausência do trabalho. Isto com base em dois fatores biológicos importantes: a ovulação, que é o período mais produtivo da mulher, e a menstruação, que é o menos produtivo. E tem mais: a adoção desta licença, por aquelas que assim o desejarem (sem qualquer obrigatoriedade), ajuda a diminuir o tabu que envolve o assunto.
Terminamos o passeio em silêncio. Quando perguntei a Bart o que achava de tudo isto, ele simplesmente grunhiu: “Não sei, nunca fiquei menstruado. Vou perguntar à minha esposa o que ela acha!” Já era uma coisa positiva, pensei com os meus botões. E quando já íamos nos despedindo, soltei a última: “Bart, sabia que Maria Madalena também escreveu um evangelho, considerado apócrifo e por isto mesmo não colocado na Bíblia?”. Sem dar qualquer resposta, mau humorado, ele seguiu o seu caminho.
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou mais de 20 anos para a Radio Internacional da Holanda, país onde mora até hoje. Ele escreve todas as terças-feiras para o Domtotal.

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