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ARACNE

Grecianny Carvalho Cordeiro*

De acordo com a mitologia grega, Aracne era uma excelente tecelã e fiandeira, a qual fazia questão de dizer que o seu talento era nato, e que não o recebera da deusa Atená, como muito assim acreditavam.

Indignada com a ausência de modéstia de Aracne, a deusa Atená se disfarçou de velha e foi até a tecelã para recomendar mais humildade, sob pena de criar animosidades com a deusa. Mas Aracne não ouviu tal conselho e ficou a insultar a deusa, deixando claro que aprendera seu ofício sozinha, sem ajuda de ninguém e sem qualquer intervenção divina.
Diante disso, a deusa Atená chamou a arrogante Aracne para um desafio. Na competição de tecelagem entre as duas, a deusa Atená teceu a imagem dos deuses do Olimpo e de todas as suas vitórias sobre os mortais. Aracne, por sua vez, teceu os amores dos deuses, contudo, escolheu histórias em que suas deidades eram menosprezadas.
A deusa Atená constatou que Aracne era tão boa quanto ela e, furiosa, rasgou seu trabalho. A deusa amaldiçoou Aracne a nunca mais ter suas tapeçarias admiradas por nenhum ser humano. Aracne ficou descontente e resolveu se suicidar, sendo impedida pela deusa que, transformou-a numa aranha, de modo a que pudesse fiar e tecer por todo o sempre.
Por certo, todos nós temos algum talento, algum dom, algo que nos diferencia de outrem. Para pintar, para compor, para escrever, para palestrar, para jogar futebol, para dançar, para fazer trabalhos manuais dos mais variados, enfim, cada ser humano tem algum talento, uns mais, outros menos.
No Brasil, essa questão do talento é bem mais complexa. Acompanhamos muitos talentosos fazendo sucesso, outros nem tanto. No entanto, a distorção de valores do mundo atual nos mostra que talento não é tudo, aliás, é quase nada. A superficialidade de muitas pessoas de sucesso é patente, mas a construção midiática em torno dessas pessoas consegue dissimular todas as fragilidades, erigindo-as à condição de ídolos, muitos dos quais não duram mais que uma estação.
Ao assistirmos televisão, ao lermos jornais, quem faz sucesso? Quais são os tipos que invadem nossas casas sem que sequer questionemos ou pensemos? Que tal darmos uma passeada pela música, pela literatura, pelos programas televisivos. Quem são os ídolos de hoje? As pessoas se dispõem a qualquer coisa por três minutos de fama. Fazem o que for preciso para aparecer.
Como diz um poeta. O que é sucesso? É deitar à noite, colocar a cabeça no travesseiro e dormir em paz.
*Promotora de Justiça, escritora e presidente da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza

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