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RELAÇÃO FARMACÊUTICAS-MÉDICOS

O tempo passou, eu mudei de país, muitas coisas mudaram, mas tudo continua na mesma.
Ilustração de Marguerita Bornstein.
Ilustração de Marguerita Bornstein.
Por Lev Chaim*
Cresci ouvindo a palavra “amostra grátis”, quando estava na sala de espera do médico ou do dentista. E muitas vezes a amostra grátis era dada como um presente do doutor ao paciente que, então, não necessitava gastar dinheiro com remédios. Não que eu tenha recebido alguma, mas sempre ouvia estas histórias. E agora, ainda existem coisas desse tipo?
O tempo passou, eu mudei de país, muitas coisas mudaram, mas tudo continua na mesma. Ou melhor, mais profissionalizado. Na Holanda, um órgão que registra a transparência das relações entre farmacêuticas e profissionais do ramo médico e veterinário saiu com os seguintes números: ‘Em 2015, as farmacêuticas patrocinaram 36% mais médicos e organizações que no ano de 2014.
Em 2015, as indústrias farmacêuticas gastaram mais de 50 milhões de euros com profissionais do ramo da medicina e pacientes, ou seja, um aumento de 36% em relação ao ano anterior. A pergunta que a Holanda inteira se fez foi se esses médicos que receberam benefícios das industrias farmacêuticas se sentiram  obrigados a receitar os remédios dessas mesmas indústrias.
E tudo isto, como já havia dito, não é novo. Há dez anos, o jornalista do jornal holandês Trouw, Joop Bouma, já havia escrito um livro a respeito do assunto, com o seguinte título: ‘Slikken’ (Engolir). Ali, ele descreve os métodos usados pelas industrias farmacêuticas para convencer os médicos a prescreverem os seus remédios aos pacientes.  
É claro que muitas vezes é necessário uma estreita colaboração entre profissionais médicos e fabricantes de remédios para uma avaliação mais profunda dos efeitos dos mesmos nos pacientes. Mas, toda vez que estas cifras do órgão de transparência dessas relações são pulicadas na Holanda, muitas dúvidas ficam no ar.
E desta vez, outra notícia ganhou também as páginas dos noticiários holandeses em relação as indústrias farmacêuticas. As leis holandesas permitem que estas indústrias registrem uma determinada substância de um remédio já existente no mercado e consigam a patente do remédio por um determinado período. Com isto, elas aumentam o preço do produto.  
Esta acusação foi feita pela Organização Holandesa de Farmácias e levada ao Ministério da Saúde da Holanda. A ministra responsável acatou a queixa e disse que muitas vezes estas farmacêuticas aproveitam as brechas nas leis, para aumentarem os preços de seus produtos desnecessariamente. E ela deu um exemplo: o remédio ‘dexamfetamine’, receitado para crianças super-agitadas, há questão de duas semanas, teve o seu preço de mercado triplicado. Até o momento, não houve resposta das indústrias a essas afirmações.   
Com toda essa publicidade sobre o assunto, o povo aprende abrir os olhos com relação às poderosas indústrias farmacêuticas e se perguntar qual seria o objetivo principal delas: curar doentes ou só fazer dinheiro? E qual seria a influência que elas exercem sobre os médicos na hora deles receitarem os remédios? Como disse uma vez a filósofa alemã Hanna Arendt, nada melhor do que um povo bem informado, que aprenda a pensar por si próprio.
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou mais de 20 anos para a Radio Internacional da Holanda, país onde mora até hoje. Ele escreve todas as terças-feiras para o Domtotal.

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