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Motoristas surdos encontram no Uber uma possibilidade de trabalho e renda

Paula Montefusco
Do BOL, em São Paulo
O motorista do Uber Marcos Roberto Kuhn Avila, de Porto Alegre (RS), viu seu nome viralizar no Facebook após a postagem de um passageiro, em maio deste ano, e até agora continua colhendo os frutos de seu trabalho. Isso porque Marcos é deficiente auditivo e, trabalhando na Uber, empresa multinacional de origem norte-americana que oferece serviço de transporte particular por meio de um aplicativo, pode conduzir o passageiro ao local desejado sem necessidade de ouvir o endereço.
O designer Rafael Coronel, de Campo Grande (MS), foi quem publicou o post durante uma viagem a Porto Alegre. Quando ele entrou com os amigos no carro de Marcos e percebeu que o motorista era surdo, ficou impressionado com a possibilidade gerada pelo aplicativo. "Parei para pensar no que o Uber estava fazendo naquele momento. Não se tratava mais de uma guerra de serviços, não se tratava de uma corrida mais barata ou a experiência do serviço Uber. Se tratava de acessibilidade, inclusão... Cara, o Marcos não precisava ouvir para onde iríamos, o app mostra para ele, conseguem perceber o quão simples foi a solução?", escreveu Rafael no Facebook.
Em meio à polêmica sobre a legalidade do Uber em contrapartida aos serviços de táxi, a postagem ganhou as redes sociais. "Todos os compartilhamentos que vi foram com mensagens de pessoas apoiando o serviço, mas não consegui perceber se essas pessoas já tinham esse pensamento ou se mudaram de opinião", conta Rafael após o post viralizar.
Reprodução/Facebook
Embora aparentemente simples, a possibilidade de trabalhar pelo aplicativo pode representar uma grande chance a quem, como Marcos, tem deficiência auditiva. Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Brasil tem 9.717.318 deficientes auditivos (o que inclui pessoas com surdez total e com grande ou pequena dificuldade para escutar). Desse número, 3.683.545 trabalham (cerca de 38%) – com carteira registrada ou como autônomos.
"Queremos oferecer uma oportunidade nova e talvez nem pensada antes por essas pessoas", afirma Leticia Mazon, gerente de comunicação da Uber no Brasil. No caso de Marcos, de 29 anos, ele estava desempregado havia um ano e meio quando começou a trabalhar com o aplicativo, em 1º de abril de 2016.
Arquivo pessoal
Carlos Eduardo Cristalli Romano foi o primeiro motorista surdo do Uber no Brasil
Já para Carlos Eduardo Cristalli Romano, o primeiro motorista surdo a atuar pela Uber no Brasil, o grande atrativo foi a possibilidade de obter renda com um horário flexível. Com formação em webdesign, Romano trabalhava em um jornal do Rio de Janeiro fazendo propagandas quando decidiu trocar de emprego.
"O meu salário era mínimo porque me colocaram na cota de deficientes. Conversando com um amigo surdo americano que já trabalhava na Uber dos Estados Unidos, ele me falou para pesquisar se existia Uber no Brasil e no Rio de Janeiro", conta Romano.
Com a mudança de profissão, o aumento na renda permitiu a ele uma independência financeira maior: "Trabalho com prazer e tenho um retorno financeiro que me permite sustentar a família com um filho de quase dois anos", finaliza o motorista.
Como funciona?
Para viagens em geral, o aplicativo pede que o passageiro informe o destino final ao solicitar a corrida e já fornece uma estimativa de preço. Ao chegar ao destino, o valor é debitado automaticamente do cartão de crédito cadastrado, não sendo necessário nenhum tipo de pagamento dentro do carro.
Essa automatização já tornaria mais simples o trabalho do motorista, que pode se guiar pela rota do GPS até chegar ao local desejado, mas, no caso de deficientes auditivos, há ainda uma adaptação específica para essa categoria: em vez de alertas sonoros, o aplicativo envia alertas luminosos ao motorista para indicar solicitações de viagem ou notificações, e o passageiro também é avisado quando o motorista tem dificuldade para ouvir ou é surdo.
Divulgação/Uber
O aplicativo avisa ao passageiro que o motorista é deficiente auditivo
Mesmo com o trajeto determinado, Marcos Avila destaca que a comunicação entre ele e os passageiros costuma fluir sem problemas. "Não tenho dificuldade em me comunicar com o passageiro, escrevo o que preciso em um papel ou até no celular [enquanto estão parados]", conta o motorista.
Carlos Eduardo Romano também gosta de interagir com os passageiros. A comunicação se dá graças à leitura labial e ao fato de Romano ser oralizado, ou seja, mesmo não ouvindo, ele é capaz de falar. "Sou feliz porque recebo muitos incentivos dos passageiros sempre me elogiando!"
Como é feita a seleção de motoristas?
A Uber oferece o mesmo processo de cadastro para todos os motoristas, por isso, o treinamento é feito por tutoriais em vídeo, e o conteúdo está presente no site também por escrito.
"Ao usar vídeos tutoriais, acreditamos que conseguimos apresentar aos novos motoristas parceiros a melhor maneira de utilizar o aplicativo. Com estes vídeos, também conseguimos passar a experiência de motoristas parceiros bem avaliados na plataforma para quem está começando", explica a gerente de comunicação da Uber no Brasil, Leticia Mazon.
Além disso, a empresa pede carteira de motorista com licença para exercer atividade remunerada (EAR), certidão negativa de antecedentes criminais nas esferas estadual e municipal e todos os documentos do carro, como Certidão de Registro e Licenciamento do Veículo, Bilhete de DPVAT do ano corrente e apólice de seguro com cobertura APP (Acidentes Pessoais a Passageiros).
A avaliação é o segredo do negócio. No fim de cada viagem, o aplicativo pede que o passageiro avalie o motorista e vice-versa. A nota vai de uma a cinco estrelas, e o motorista precisa ter uma média de pelo menos 4,6 estrelas para poder circular. "A avaliação no fim de cada viagem também serve para balizar a qualidade do serviço, que é a mesma em qualquer uma das 400 cidades em que a Uber opera", afirma Leticia.
No Brasil, a empresa está nas ruas de 11 cidades. Em São Paulo, a regulamentação foi oficializada esta semana, no dia 19 de julho, e o aplicativo opera também no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Porto Alegre, Campinas, Goiânia, Recife, Curitiba, Salvador e Fortaleza, ainda sem o aval definitivo do poder público.
"Queremos oferecer uma plataforma inclusiva, que permita a todos apertar um botão e gerar renda para si e sua família. Os motoristas parceiros também são usuários da plataforma, que oferece total flexibilidade para que eles se conectem e trabalhem quantas horas quiserem, quando quiserem, sem qualquer tipo de horário mínimo", explica a gerente da Uber.
No caso dos táxis, motoristas surdos também podem trabalhar normalmente, porém não há incentivos específicos à categoria. Na cidade de São Paulo, por exemplo, os aplicativos de táxi trabalham com motoristas que preencham os requisitos exigidos pelo Departamento de Transportes Públicos (DTP) da Secretaria Municipal de Transportes (SMT).
Segundo as regras do departamento, o condutor que quiser obter o Condutax deverá concluir o curso especial de taxista, apresentar RG, CPF, as folhas de certidões explicativas judiciais e CNH válida com a observação que exerce atividade remunerada. "Caso o condutor preencha esses requisitos, não há impedimento para a emissão do Condutax, desde que o Detran forneça a CNH para o motorista com deficiência", informa o DTP por meio de sua assessoria de imprensa.

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