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49º Festival de Brasília do Cinema

Produção do Rio Grande do Sul, Rifle, de Davi Pretto, é o primeiro longa-metragem da mostra competitiva exibido no 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro

Camila Vieira
Enviada a Brasília

(Davi Pretto (à esquerda) e equipe do longa Rifle na exibição do filme. Foto: Divulgação/Junior Aragão)
Em uma região rural do Rio Grande do Sul, o jovem Dione vive com uma família em uma fazenda, que está sendo constantemente vigiada por um rico proprietário que deseja comprá-la. A premissa narrativa do longa-metragem de ficção Rifle, de Davi Pretto, recorre a um protagonista que resiste às estratégias do poder para lutar por sua própria permanência em um território tanto geográfico quanto afetivo – algo que lembra a personagem Clara, de Aquarius, de Kleber Mendonça Filho. “Fiquei feliz com a semelhança entre estes filmes. Penso que é um momento em que pensamos coisas importantes que precisam ecoar”, afirma Davi, no debate sobre o longa, no dia seguinte a exibição do filme no 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Inserido na seleção dos nove longas da competição do festival, Rifle é um projeto que se originou em 2010, ainda no início da produtora Tokyo Filmes, da qual Davi Pretto é sócio. “É o resultado de muitas visitas, reescritas, processos e viagens. Representa um ciclo se fechando na nossa carreira”, explica Davi. Em parceria com o roteirista Richard Tavares, o processo de construção da narrativa se deu a partir do encontro com pessoas que habitavam a região. “A gente sentiu a intensidade e a angústia do protagonista, que falava muito de uma situação rural que nos incomodava”.
Durante a pesquisa para o filme, Richard recorda a observação de casas isoladas no meio do campo. “Conhecemos lugares que estavam se esvaziando. Tentamos entender para onde as pessoas iam, se migravam para a cidade ou não”, comenta o roteirista. Com elipses, silêncios, dilatação do tempo e minucioso desenho sonoro, os detalhes formais de Rifle emergem. É possível identificar inúmeras referências, desde o cinema de Abbas Kiarostami e de Lisandro Alonso, passando pelo gênero do faroeste e outras mais sutis, como Na Mira da Morte (Targets, 1968), de Peter Bogdanovich, em que há inspiração no desenvolvimento das sequências de tiros contra os carros que passam na estrada. “Tem disputa de território, a violência no campo, o personagem errante com passado misterioso”, pontua Davi.
Na construção sonora de Rifle, o desconforto do personagem com as constantes invasões é amplificado, com ruídos dentro da casa e no ambiente externo.
“Construímos o som a partir da matéria orgânica nas locações. Os elementos fantásticos surgiram deste material”, explica Tiago Bello, que fez o som direto. A escolha do elenco aconteceu junto com a feitura do roteiro, que foi reconstruído até o momento da filmagem em 2015. “Rifle nasceu de um embrião ficcional para criar pontos de contato com a realidade. Queria o elenco com uma família de verdade”, afirma o diretor. Foi quando a equipe encontrou Dione Avila, que interpreta o protagonista homônimo. “Não sabia que tinha talento para ator. Eu me senti a vontade como se eles fossem da minha família”, comenta Dione.
Curtas na competição
Na noite de quarta (dia 21), a mostra competitiva de curtas e/ou médias-metragens exibiu a ficção baiana Ótimo amarelo, de Marcus Curvelo, e a animação paulista Quando os dias eram eternos, de Marcus Vinicius Vasconcelos.
O primeiro curta foi filmado no bairro Rio Vermelho, em Salvador, que é marcado por obras de requalificação. “Fique com a vontade de discutir o bairro, o processo de gentrificação, de priorizar certas classes sociais da cidade. Quando tinha 10 anos, entendia aquele bairro como lugar de transição, que está sempre buscando algo e as pessoas tinham que sair dali para ser alguma coisa”, afirma o diretor e ator do curta, Marcus Curvelo.
A animação Quando os dias eram eternos é uma homenagem não só à mãe do diretor Marcus Vinicius como também ao dançarino e coreógrafo japonês Kazuo Ohno. “É uma história pessoal do momento que perdi minha mãe. Foi duro me colocar no filme”, comentou Marcus Vinicius. O realizador desenvolve um traço de animação muito singular, que remete ao movimento da dança. “Gosto do traço solto, do desenho vibrando na tela. O processo obsessivo de fazer animação tem uma relação com o processo obsessivo do luto. Nenhum frame é igual ao outro. Era a dança que fazia com a mão”.

*A repórter viajou a convite do Festival.

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