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Brasileiras criam projeto e emocionam africanos que escrevem usando a terra

Crianças de Moçambique são alvo de projeto de mulheres de Santos (SP). Cadernos personalizados são criados para que crianças possam estudar.

Mariane Rossi
Do G1 Santos


Crianças com os cadernos, em Moçambique, na ação realizada em 2015 (Foto: Divulgação/ONG Fraternidade Sem Fronteiras)Crianças com os cadernos, em Moçambique, em 2015 (Foto: Divulgação/ONG Fraternidade Sem Fronteiras)













Um projeto de Santos, no litoral de São Paulo, fez com que crianças africanas acostumadas a escreverem no chão de terra ganhassem cadernos personalizados para estudar. Objeto tão simples para alguns, cadernos são considerado artigo de luxo para eles, que vivem em situação precária em aldeias de Moçambique. Mobilizadas com a realidade desses meninos e meninas, um grupo de voluntárias resolveu fazer cadernos com o nome de cada um deles. Bem decorados e coloridos, eles cruzam o oceano e fazem cada criança se sentir mais especial.
O sorriso das crianças na África encantou a pedagoga Ana Lucia Caetano, de 54 anos. Ela viu um video sobre o trabalho da ONG Fraternidade Sem Fronteiras durante um congresso e foi conversar com o coordenador da ONG, Wagner Moura. Ela mostrou o interesse em ajudar e enviar livros para as crianças. Moura sugeriu cadernos.

“O caderno é um artigo de luxo para as crianças. Eles fazem a lição na terra batida e, quando estão firmes na escrita, eles passam para o caderno. Eles recebem um bloco de anotações por ano do governo. Caderno é uma coisa que eles não têm e seria muito bom ter. Daí, eu disse que faria uma campanha em Santos”, explica.

Na volta da viagem, Ana Lucia começou a pensar em como poderia viabilizar o projeto. “Eu desci do avião e pensei em personalizar os cadernos com o nome de cada criança. Elas não tem nada delas, tudo é muito coletivo”, conta.

Cadernos personalizados com o nome das crianças  (Foto: Roberta Petin)Cadernos personalizados com o nome das crianças (Foto: Roberta Petin)
Ana ligou novamente para a ONG para compartilhar a nova ideia e a organização mandou uma lista com o nome das crianças de aldeias de Moçambique. De acordo com a ONG, a maioria delas é órfã porque os pais morreram de AIDs. Algumas assumem a responsabilidade de cuidar dos irmãos mais novos. Elas recebem atendimento nos Centro de Acolhimento da ONG, onde há apoio, lazer alimentação e educação.
Com o nome das crianças em mãos, Ana conseguiu mobilizar amigas e professoras. Elas abraçaram a ideia do projeto e começaram a fazer as capas de caderno personalizadas. Com o auxílio das amigas Sandra Carvalho e Roberta Petin, Ana criou um grupo no Facebook que ajudou a manter pessoas mobilizadas em prol da causa.
“Eu peguei listas e repassei para as minhas amigas que gostam de fazer arte. Saíram trabalhos muito bonitos”, relata Sandra. Cada caderno foi feito por uma das voluntárias, com cores, tecidos e desenhos diferentes e, o mais importante, o nome de cada criança. A intenção é que cada uma delas se sentisse especial. “Mais do que a beleza estética da capinha, o que conta é a energia que vai ali”, afirma Roberta.
Exposição das capas de cadernos em Santos (Foto: Gabriel Alves)
Exposição das capas de cadernos em Santos
(Foto: Gabriel Alves)
Antes de enviar todo o material para o continente africano, elas fizeram um evento em uma escola de Santos para encerrar a ação. Logo depois, o grupo enviou para a África as capas personalizadas e também o dinheiro para a compra do caderno, em Maputo, na capital de Moçambique. Assim, não tiveram despesas com o transporte dos cadernos, o que sairia muito mais caro.

Dias depois, os voluntários em Moçambique mandaram as fotos das crianças recebendo os cadernos. Todo o trabalho foi compensado pelo sorriso de cada uma delas. “É a maior emoção ver o caderno da gente na mão deles. Eles fazem um filme de entrega em todas as aldeias. A gente vê o começo, o meio e o fim do processo. Foi tão rápido e deu tão certo. A corrente do bem vai além do que a gente imagina”, conta Ana.

Neste ano, elas vão repetir a ação e aumentar o número de capas de cadernos confeccionadas. Os nomes das crianças já foram distribuídos entre os voluntários. As famílias estão se reunindo para fazer as capinhas e amigas se juntam para compartilhar o trabalho voluntário.

O evento de encerramento da ação acontecerá no dia 2 de novembro, mas os voluntários ainda precisam de ajuda para pagar os custos. O dinheiro do ingresso será para auxiliar a abertura de um poço em uma das aldeias. Todos os anos, a ONG faz caravanas e as pessoas podem ir e conhecer o trabalho de perto.
A doação dos cadernos também representa a doação de tempo, dedicação e carinho de cada voluntário. Ao decorar as capinhas, o bem que eles depositam em cada uma delas também retorna para eles. “Parece que as coisas fluem mais. Tivemos notícias de pessoas que estavam em estado depressivo. Dez capinhas de caderno moveram as pessoas a saírem da tristeza. Aparentemente, não tem nenhum segredo, é uma simples ação”, acredita Roberta.

Sandra diz que as crianças são sofridas, mas alegres. Ao olhar as fotos, ela fica emocionada porque eles parecem ter muito pouco, mas expressam muita gratidão ao receber um simples presente. “A gente sabe que elas ficam felizes de ter alguma coisa delas, algo que fizeram para elas. Recebemos mais do que doamos. Recebemos esse amor tão grande e fazemos com muito amor”, afirma Sandra. “As crianças andam com o caderninho debaixo do braço. Ter um caderno com o seu nome é uma ideia muito simples com um significado muito grande”, finaliza Roberta.

Crianças recebem os cadenros personalizados em Moçambique (Foto: Divulgação/Fraternidade Sem Fronteiras)Crianças recebem os cadernos personalizados (Foto: Divulgação/Fraternidade Sem Fronteiras)

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