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Atuar na era digital

Filhos da atriz Audrey Hepburn (foto maior) autorizaram uso de imagem para comercial de chocolate
por Antonio Laudenir - Repórter
Considerado (e com uma certa dose de exagero) um dos piores diretores da história do cinema, Ed Wood (1924-1978) arquitetava todo tipo de sandice para finalizar seus filmes. Sem patrocínios ou algum grande estúdio capaz de bancar os bizarros projetos que inventava, o realizador se virava através das mais diferentes picaretagens. Uma destas foi brilhantemente apresentada na cinebiografia "Ed Wood" (1994), de Tim Burton.
A poucos dias de rodar o clássico B "Plano 9 do Espaço Sideral" (1959), Wood perdeu sua mais proeminente estrela, o decadente e moribundo Bela Lugosi (1882-1956). Para manter o eterno Drácula vivo na produção, Wood inseriu imagens de projetos inacabados (tralhas como "Tomb of the Vampire" e "The Ghoul Goes West)" e o melhor, chamou um desconhecido professor de quiropraxia, chamado Tom Mason, para substituir Lugosi no filme.
Como uma espécie de dublê, ele aparecia no filme cobrindo parte do rosto com uma capa, mesmo sendo careca e muito mais alto que o falecido astro húngaro. Foi dessa forma que Wood triunfaria mais uma bizarrice em sua trajetória.
Seis décadas já se passaram e neste intervalo, computadores deixaram as páginas dos livros de ficção científica para se fixarem como ferramenta comum na indústria do entretenimento. Para o cinema, constituiu-se um útil canal para a construção de cenários, criação de universos e até mesmo ressuscitação de atores mortos. Sem comparar os milhões envolvidos e o atual momento onde está inserido, um caso semelhante ao truque de Ed Wood acaba de acontecer em Hollywood, através do filme "Rogue One: Uma História Star Wars" (2016).
Vida
A obra apresenta os acontecimentos anteriores a "Star Wars Episódio IV: Uma Nova Esperança" (1977). Por conta desta questão cronológica, os realizadores entenderam como necessário à narrativa trazer o ator britânico Peter Cushing (1913-1994) de volta à vida. A empreitada só foi possível por conta dos efeitos visuais de última geração.
Para reprisar o papel de Grand Moff Tarkin, outro ator inglês, Guy Henry, atuou fisicamente no set, enquanto na pós-produção, seu rosto foi substituído pela mão de obra dos artistas e engenheiros da Industrial Light & Magic.
Outros atores retornaram de forma artificial. Em 2004, Sir Laurence Olivier (falecido em 1989) apareceu em "Capitão Sky e o Mundo de Amanhã". Já o icônico Marlon Brando (falecido em 2004) reaparece em "Superman - O Retorno" (2006). Mesmo assim, anos depois da evolução desta trucagem digital, as dúvidas sob o nível de precisão da segunda vinda de Peter Cushing são constantes.
Quando "Final Fantasy: The Spirits Within" foi lançado em 2001, a especulação sobre atores digitais serem a onda do futuro tomou de conta dos noticiários. De lá para cá, ainda é nebuloso afirmar com propriedade que alguém deixará de perceber as diferenças entre um CGI e um ator real. Em tempo, o ser de carne e osso ainda destaca a artificialidade de sua coestrela digital. A ressurreição de Cushing foi anunciada em agosto de 2015 e as dúvidas em torno da possibilidade de um ator morto atuar geraram incessante debate. Por enquanto, desde que entrou em cartaz no dia 15 de dezembro, a recepção entre os fãs de "Rogue One" mostrou-se satisfatória. Já no campo das implicações morais e legais, o uso da imagem de figuras públicas falecidas tem sido a herança principal do novo capítulo da franquia.
Em um artigo produzido para a revista Variety, os jornalistas Dave McNary e Gene Maddaus argumentam que o Estado da Califórnia lidera o caminho na proteção da imagem de um ator após a sua morte. Através de lei aprovada em 1984, o direito de uso da imagem (seja para fins publicitários também) é garantido por um período de 50 anos após a morte do indivíduo.
Esta lei foi a resposta para uma decisão judicial onde concluiu-se que os herdeiros de Bela Lugosi (olha ele aí, novamente) não tinham poder para impedir o uso de sua imagem na mercadoria da obra "Drácula" (1931). Por insistência da Screen Actors Guild (SAG), sindicato que representa mais de 120 mil atores nos Estados Unidos, esse tempo se estendeu para 70 anos.
Porém, as proteções oferecidas pela lei californiana se aplicam apenas aos que falecem naquele Estado. No Reino Unido, onde Cushing viveu e morreu, inexiste regulamentação semelhante. Mesmo assim, a Lucasfilm se assegurou de obter permissão da propriedade de Cushing para usar sua semelhança em "Rogue One".
Histórico
Inúmeros casos no mercado denunciam como computadores e tecnologia digital tem sido empregados para inserir artistas falecidos. Em 1993, uma tragédia tomou conta dos bastidores do filme "O Corvo". Brandon Lee (1965-1993) morreu durante as filmagens após ser atingido acidentalmente por uma bala de verdade. Para acomodar a ausência do jovem ator, que só tinha mais três dias de trabalho no set, efeitos digitais colocaram seu rosto no corpo de dublês para finalizar cenas- chave.
Produções como "Cliente Morto não Paga" (1982), "Zelig" (1983) e "Forrest Gump" (1994) trouxeram personalidades do passado para interagir com atores daquele presente. O diretor de "Gump", Robert Zemeckis, gostou dessa vertente e ressuscitou o ator Humphrey Bogart (1899-1957). Em 1995, com ajuda de artistas da ILM, ele trouxe Bogart para um episódio da série "Contos da Cripta", chamado "You, Murderer".
Diário do Nordeste

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