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'Neruda' revisita a figura do poeta chileno sob chave literária

Por Neusa Barbosa
Pablo Larraín dirige o filme 'Neruda'.
Pablo Larraín dirige o filme 'Neruda'. (Divulgação)
Poeta maior, o chileno Pablo Neruda tem inspirado diversos filmes (vem logo à mente o doce “O Carteiro e o Poeta”, de Michael Radford). Recentemente, um episódio real de sua vida, sua fuga do Chile no final dos anos 1940, quando sofreu perseguição por motivos políticos, foi objeto de um filme um tanto limitado, “Neruda – Fugitivo”, de Manuel Basoalto.
Evidentemente, tratando com imensa liberdade e nenhum compromisso documental do mesmo episódio, o talentoso e premiado diretor chileno Pablo Larraín (de “No” e “Tony Manero”) foi muitíssimo mais longe em “Neruda”, criando um filme com alta temperatura literária e também dimensionando com mais complexidade as nuances contraditórias da personalidade do famoso poeta.
O filme, que estreou na Quinzena dos Realizadores de Cannes em 2016, foi indicado ao Globo de Ouro e representa o Chile nas indicações ao Oscar de filme estrangeiro.
Partindo de um roteiro de Guillermo Calderón, desenvolve-se a fascinante jornada de Neruda (Luis Gnecco), um ativo senador comunista no Chile de 1948, cujo partido é traído depois de apoiar a eleição de Rafael Videla (o esplêndido Alfredo Castro, ator habitual nos filmes do diretor).
O partido é posto na ilegalidade, Neruda perde o cargo e é alvo de um mandado de prisão, colocando-se em fuga com sua mulher, Delia del Carril (Mercedes Morán).
A parte mais fascinante do roteiro é a invenção de um personagem, o policial Oscar Peluchonneau (Gael García Bernal), encarregado da perseguição ao poeta e também obcecado por ele. São de Oscar as instigantes observações de uma onipresente narração, deflagrando um jogo que instaura um clima semimágico no coração do filme.
Neruda, por sua vez, aparece mais nítido, de carne e osso, tanto no confronto com seus opositores quanto diante de sua mulher, assim como em suas repetidas visitas a bordéis. Nada se escamoteia na definição de seu retrato, que não se torna menor por isso, já que a força de sua poesia, maior do que a vida e do que ele mesmo, não é subtraída.
Explorando em uma obra já consistente os mitos e pesadelos chilenos --há uma pequena nota em “Neruda” lembrando o início do então tenente Augusto Pinochet como carrasco de um campo de prisioneiros políticos--, Larraín acerta de novo.

Reuters

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