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'Pensando no futuro', diz criador de teclado comandado por cérebro

Do G1
Superar obstáculos é a rotina de vida de Cláudio Luciano Dusik. Ao nascer, sua mãe ouviu dos médicos que ele dificilmente chegaria aos 7 anos e que não havia registro na história da medicina de pacientes com atrofia muscular espinhal (AME) com 14 anos. Hoje, aos 39, Cláudio finaliza sua tese de doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Na semana do aniversário de 5 anos do G1 RS, revisitamos algumas histórias de repercussão positiva, contadas a partir do ano de estreia do portal, em 2011. As reportagens são publicadas de segunda (12) a sexta(16). Nesta quarta-feira, a matéria recorda a história de superação de Cláudio Luciano Dusik e de como ele usa suas habilidades para proporcionar acessibilidade para outras pessoas, e conta o que ele conquistou desde 2013.

A doença que afeta Cláudio deforma o corpo e limita os movimentos físicos, mas não retira a vontade de viver e de ultrapassar barreiras. Em 2013, ele concluiu o mestrado com um projeto no qual criou um teclado virtual que permite a pessoas com deficiência digitar com rapidez, pois as letras do alfabeto estão agrupadas em famílias silábicas. Graduado em psicologia, Cláudio também atende pacientes no consultório que mantém em casa na cidade de Esteio, na Região Metropolitana de Porto Alegre.

Faço esse projeto pensando no meu futuro também, pois vai chegar o dia em que não vou
poder me comunicar"
Cláudio Luciano Dusik
Agora, no doutorado, ele desenvolve uma atualização para o teclado virtual. Na nova versão, o dispositivo poderá ser comandado por ondas cerebrais. O trabalho está em fase de finalização. O maior teste, no entanto, já ocorreu.

"Este ano, eu estive internado na UTI após uma parada respiratória em função da doença. Eu queria dizer que estava com um incômodo na traquéia e minha família não entendia. Aí, meu irmão lembrou que eu estava desenvolvendo o software e levou o computador e o dispositivo até o hospital. E funcionou. Fiquei feliz porque estou fazendo esse projeto pensando no meu futuro também, pois vai chegar o dia em que não vou poder me comunicar", conta.

Ainda no hospital, Cláudio ouviu dos médicos que, se tivesse alta, não conseguiria mais respirar sem a ajuda de aparelhos. Com a superação que lhe é característica, driblou mais este diagnóstico e foi para as ruas de Esteio, sua cidade natal, carregar o maior símbolo esportivo do mundo: a tocha olímpica.

Mundo que Cláudio conheceu após a repercussão de suas entrevistas ao G1 e ao programa Fantástico, da Rede Globo. "Depois disso, recebi convites para palestras no Brasil todo. Também apresentei meu trabalho em Portugal, no México e no Paraguai", conta ele, orgulhoso. "Dei mais de mil palestras", complementa.

Tocha olímpica, teclado virtual, ondas cerebrais, Cláudio Luciano Dusik, Esteio, doutorado, UFRGS (Foto: Cláudio Dusik/Arquivo Pessoal)Auxiliado pela mãe Elisa, Cláudio desfilou com a tocha olímpica pelas ruas de Esteio (Foto: Cláudio Dusik/Arquivo Pessoal)


Ondas cerebrais comandam teclado
A força do pensamento é a base da dissertação de doutorado de Cláudio na UFRGS. E isso não é apenas figura de linguagem. A leitura das ondas cerebrais é o que permite que o software do teclado virtual compreenda qual é a tecla que o usuário pretende digitar para formar palavras e frases.

"Tu coloca um dispositivo na testa, tipo uma tiara, e no computador vai aparecer o teclado virtual. Você precisa estar relaxado. Aí, o software faz uma varredura com as teclas e, quando chegar na que se deseja apertar, emito um pensamento que tire o cérebro do relaxamento. A grosso modo, o computador transforma em um clique toda vez que há um aumento da atividade cerebral", explica Cláudio.
Teclado virtual, ondas cerebrais, Cláudio Luciano Dusik, Esteio, doutorado, UFRGS (Foto: Cláudio Dusik/Arquivo Pessoal)
Dispositivo acoplado à cabeça transforma ondas
cerebrais em cliques no teclado virtual
(Foto: Cláudio Dusik/Arquivo Pessoal)
Ele lembra que encontrou o hardware do programa, que é utilizado em jogos de videogame, em uma pesquisa na internet. "Pensei, se por ondas cerebrais as pessoas conseguem brincar, porque não fazer coisas úteis?", questiona Cláudio.

Diferente do teclado virtual desenvolvido no mestrado e disponibilizado de forma gratuita, este trabalho terá o custo do dispositivo, cerca de 300 dólares, para quem tiver interesse.

"O custo é alto, mas considerando o benefício não é tão alto assim, até porque o sistema vai ser gratuito. Para quem não consegue se comunicar, não tem valor. Imagina poder dizer que está doendo a traqueia", brinca. "Ou que quer uma comida diferente", propõe.
Trabalho para transformar realidades
Cláudio trabalha na secretaria municipal de Educação de Esteio há 15 anos como servidor concursado. Na pasta, busca proporcionar o acesso universal ao ensino na cidade.

"Participei da equipe que transformou as 23 escolas municipais em escolas inclusivas, que têm educação especial dentro das salas comuns. Contribuí também para que houvesse transporte acessível. Este ano, uma aluna com síndrome de Down entrou na faculdade. Isso dá um orgulho", alegra-se.

Em dezembro de 2013, ele recebeu do Senado Federal a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara. A condecoração é entregue, anualmente, a cinco personalidades com relevante contribuição à defesa dos direitos humanos no país.

Em 2016, lançou-se na política e disputou uma vaga para a Câmara de Vereadores da cidade. Foi o 10º mais votado, com 1.125 votos, algo que surpreendeu até o Claudinho, como é conhecido em Esteio, acostumado a surpreender os outros.

Ele diz que aceitou concorrer por convite e pela insistência de amigos, mas também pela possibilidade de ter mais recursos e condições para implementar leis e desenvolver projetos benéficos a pessoas com deficiência.
Agora, Claudinho é o 1º suplente no legislativo de Esteio. "Fiquei surpreso pela quantidade de votos. Saio na rua e todo mundo me conhece. A campanha não teve nenhum investimento financeiro. Foi tudo nas redes sociais e no boca a boca. Estou feliz", conta.
Título comendador Direitos Humanos, teclado virtual, ondas cerebrais, Cláudio Luciano Dusik, Esteio, doutorado, UFRGS (Foto: Reprodução/Facebook)Cláudio ao lado diploma de Comendador de Direitos Humanos (Foto: Reprodução/Facebook)

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