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Cantora Carminho (Portugal) interpreta a obra do maestro Tom Jobim

CANTORA CARMINHO
A cantora portuguesa Carminho: flerte com a música brasileira vinha desde discos anteriores.
A portuguesa Carminho, 32 anos, já nasceu próxima das tradições musicais de seu país. Filha da cantora de fado Teresa Siqueira e nascida Maria do Carmo, em Lisboa, ela também tornou-se fadista. Com três discos lançados, de 2009 a 2014, chega ao quarto trabalho interpretando um repertório dentre os mais afinados à identidade musical brasileira: a obra de Tom Jobim (1927- 1994).
O álbum, intitulado "Carminho canta Tom Jobim", saiu pela caprichosa gravadora carioca Biscoito Fino, reunindo 14 faixas, e também está disponível nas plataformas digitais de streaming. Em três versões do repertório clássico, ela faz dueto com os medalhões nacionais Marisa Monte ("Estrada do Sol"), Chico Buarque ("Falando de Amor") e Maria Bethânia ("Modinha"). A atriz Fernanda Montenegro, outro nome clássico da cultura brasileira, participa da introdução de "Sabiá".
A direção musical do álbum ficou a cargo de Paulo Jobim, filho de Tom. Paulo ainda articulou uma reedição da "Banda Nova", formação de músicos criada em 1984 para acompanhar o maestro carioca durante seus 10 últimos anos de carreira. Além dele, no violão, o conjunto que agora acompanhou Carminho traz Daniel Jobim (piano), o renomado Jaques Morelenbaum (violoncelo) e Paulo Braga (bateria).
Em "Canto" (Warner, 2014), seu último disco, Carminho já flertava de perto com a música brasileira. "O sol, eu e tu" é composição de Caetano Veloso, em parceria com César Mendes e Tom Veloso. E a portuguesa ainda fez dueto com Marisa Monte ('Coisas"), repetindo a experiência agora.
"Carminho canta Tom Jobim" foi gestado a partir de encontros dela com a família de Tom Jobim no Brasil. A portuguesa e Paulo Jobim passaram a buscar repertório, pensar instrumentação, arranjos e a parceria terminou culminando na produção do álbum, assinada por ambos.
Repertório
O disco abre com uma versão de "O que tinha de ser", fruto da parceria clássica de Tom com o poeta Vinícius de Moraes (1913-1980). A voz de Carminho vai se "espalhando", acompanhada por um arranjo instrumental minimalista e lírico. "Inútil Paisagem", logo em seguida, transcorre em um tom mais moderado, com a intérprete segurando a onda de seus sussurros na composição de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira.
O clássico "Estrada do Sol" (Tom e Dolores Duran) traz um dueto de voz com Marisa Monte. Mesmo sustentando a elegância de uma versão em ritmo de valsa, o conjunto faz jus ao título, apelando para um clima solar e levantando o astral.
A interpretação de "Retrato em branco e preto" (Tom e Chico Buarque) deixa claro que o álbum traz, com o "exagero" do vocal de Carminho, a dramatização de uma narrativa. A voz em primeiro plano chama atenção para o canto, de tal forma que o que há de instrumentos parece encaixado nesta versão "por acaso".
A bossa "Triste" recupera o ânimo (olha aí!) da sequência. Criando uma imagem para esta versão acompanhar feito uma trilha sonora, dá para pensar numa dama, de vermelho e vestido longo, tirando o salto alto para ralar os pés no tablado sambando.
"Meditação" (Tom e Newton Mendonça) mantém a sequência bossanovista. Aqui, o piano - tão característico da musicalidade do "maestro soberano" - ganha relevo na sonoridade. "O Grande Amor", mais uma da safra com Vinícius de Moraes, traz o momento em que Carminho dá permissão para que a melodia da composição "tome espaço" e seu vocal soe mais discreto.
Esse é o momento ameno, suave do disco, que prepara o terreno para a catarse que vem, em seguida, com "Falando de Amor", dueto dela com Chico Buarque. Com um arranjo clássico, Carminho e Chico dão aquele tom de "suspensão" à sequência do álbum, interpretando uma versão grandiosa de mais um clássico de Tom Jobim.
Wave
A versão da clássica "Wave" mantém a estrutura de uma das obras de maior força no repertório do maestro. O clássico talvez seja um dos temas mais explorados pelas formações instrumentais no cenário da música brasileira, por exemplo. A potência da letra não fica atrás, se sustentando como um discurso poético por si só: "Agora eu já sei, da onda que se ergueu no mar/ E das estrelas que esquecemos de contar/ O amor se deixa surpreender/ Enquanto a noite vem nos envolver".
A lírica "Luiza" aparece no álbum em uma versão que aponta para outros caminhos além da ênfase na melodia. Com o arranjo do piano soando mais experimental, se o ouvinte comparar às performances de Tom Jobim interpretando a canção, eis o contraste com esta, mais soturna. "Modinha" traz dueto com Maria Bethânia. A voz da baiana conduz o começo da versão, em primeiro plano, mantendo o clima fechado da faixa anterior.
Já "Felicidade", do famoso refrão "Tristeza não tem fim, felicidade sim", aparece numa levada de samba. Nesta faixa, dá para perceber como a interpretação de Carminho às vezes soa "independente" do instrumental. A cantora não economiza em seu tom dramático, enquanto o arranjo "solar" acompanha sua performance vocal.
Diário do Nordeste

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