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Com obras iniciadas em 2013 e logo paralisadas, o Memorial Cego Aderaldo, em Quixadá, segue no papel

por Alex Pimentel - Especial para o Caderno3
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Memorial Cego Aderaldo, à espera de novas obras; abaixo, estátua do cantador ( Fotos: Alex Pimentel )
Em junho de 2105 o então secretário de Cultura do Ceará, Guilherme Sampaio, visitou o Memorial Cego Aderaldo, em Quixadá. O espaço cultural surgiu a partir da restauração do antigo casarão de Maria Gomes, situado defronte à Praça José de Barros, no Centro da cidade.
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Aproveitando a visita de inspeção, o secretário estadual se reuniu com a sociedade, profissionais ligados ao setor cultural e gestores públicos, para marcar o início do seu funcionamento - o prazo era até o fim daquele ano, restando apenas o fornecimento da mobília e a definição de quem ficaria a cargo da administração.
Passados um ano e meio, o Memorial ainda não foi inaugurado. O secretário de Cultura, Esporte e Juventude de Quixadá, Audênio Moraes, que assumiu o cargo no início deste ano, na gestão do prefeito Ilário Marques, estuda junto à Secult a possibilidade da sua pasta assumir o controle do equipamento cultural. Nele deverá funcionar uma oficina e escola de rabecas e de xilogravuras, para a produção de livretos de cordel. Também está prevista uma exposição de parte do acervo pessoal de Cego Aderaldo, embora no museu da cidade, o Jacinto de Sousa, exista um vão dedicado ao poeta popular e repentista.
Abandono
Segundo a Secult, a obra de reforma do casarão, mantendo os traços arquitetônicos originais, foi iniciada em outubro de 2013. O prazo de execução era de cinco meses.
O madeiramento do telhado foi substituído, as alvenarias foram rebocadas e o piso de madeira substituído.
Os serviços incluíram instalações elétricas, hidráulicas e sanitárias e a colocação das novas esquadrias seguindo o modelo original. O valor da obra foi R$ 475.869,89. Os recursos foram do Governo do Estado. Hoje, o estado do prédio é de abandono.
Quando estiver funcionando o Memorial resgatará e exaltará o "Mestre da Cantoria", título atribuído a Cego Aderaldo por seus contemporâneos, em razão das disputas de viola com outros cantadores, nas quais sempre se sobressaía por conta dos seus improvisos aguçados.
Retornava das viagens ao Norte, pelo Nordeste e até à capital paulista, com mais fama e dinheiro na bagagem. O sucesso também transformou Quixadá no recanto dos repentistas violeiros. Suas proezas eram motivo de orgulho na cidade, conforme relembra o pesquisador João Eudes Costa, de quem foi amigo.
Mas o tempo passou, Cego Aderaldo adoeceu e foi morar em Fortaleza, onde morreu. As "pelejas", como eram conhecidos os desafios de rimas entre os cantadores, foram desaparecendo. Na cidade, praticamente não existem mais.
Além de Miguel Peixoto, comerciante entusiasta do gênero, falecido, apenas o repentista Guilherme Calixto, o poeta Erasmo Barreira e o comerciante João Soares - este último um dos idealizadores do Encontro de Profetas da Chuva, realizado tradicionalmente em Quixadá - dedicam-se à promoção dessa cultura.
Esquecimento
Hoje, fora o pequeno espaço no museu, lembranças de Cego Aderaldo emergem apenas quando é realizado algum sarau nas escolas ou ao se avistar a estátua no pátio da rodoviária. Mesmo assim, o personagem acaba frequentemente confundindo com algum político. A escultura de cimento retrata fielmente o cantador, com seus trajes característicos, o paletó e o chapéu.
A viola, apesar do tamanho em proporção real, parece passar despercebida diante do olhar dos transeuntes, como se o silêncio das suas cordas emudecessem a história.
Entretanto, todos os anos o cantador é homenageado por quem admira a cultura nordestina. No ano passado, além do Encanta Quixadá - festival de repente realizado a quase uma década - a exposição "Cego Aderaldo: A trajetória de um poeta", no Centro Cultural Rachel de Queiroz, destacou sua trajetória como um dos maiores colaboradores da musica popular do Ceará.
Em 2015 ele também foi homenageado, na IV Edição do Festival da Cantoria, Tradição, Crença e Poesia, realizada pelo Instituto Assum Preto, de Senador Pompeu. A programação foi diversificada, com apresentação de repentistas e trovadores, seguida de folguedos da cultura popular e do Grupo Folclórico Junino Flor de Mandacaru, do município de Cariré, que desenvolveu a temática "Cego Aderaldo o Poeta do Sertão: rimas, versos e cantorias",
"Quem chega de longe para participar ou apreciar as disputas de cantoria se sente em casa", observa o produtor do evento, Adriano Souza.
Quem quiser conhecer a casinha onde Cego Aderaldo morou a maior parte da sua vida, ela ainda está erguida, no fim da Avenida Plácido Castelo.
Quando foi presidente da Fundação Cultural de Quixadá, a ex-vereadora Irisdalva Almeida, a Dadá, trabalhou pela identificação e catalogação dos bens do cantador. A ideia era transformar sua antiga morada no Memorial e ali abrir à visitação seu relicário.
Mas a família preferiu são dispor o imóvel para esse fim. Foi da humilde morada, aliás, que roubaram seu violão, em 2013.O sumiço ainda é um mistério.

Diário do Nordeste

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