Pular para o conteúdo principal

Obra apresenta dois momentos da história do povo Araweté que habita a região do Xingu, no Pará

Em 1981, quando o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro conheceu os Araweté, com o propósito de pesquisa de doutorado, eles tinham apenas cinco anos de contato oficial com os brancos. Hoje, pouco mais de quatro décadas após o estabelecimento inicial das relações amistosas com a Funai, o povo tupi da Amazônia já sentiu o prazer e a dor de conhecer o lado de cá.
É a partir de um recorte dessa vivência que um livro - sob o olhar de Viveiros e dos seus alunos Camila de Caux e Guilherme Orlandini Heurich, já doutores em antropologia social -, foi recém-editado pelo selo Edições Sesc.
Se a pesquisa de Viveiros, já na década de 1980, dava conta das primeiras informações sobre a língua, os rituais de caça, a alimentação, as relações afetivas, sexuais e reprodutivas, as características da agricultura, o xamanismo, as posições hierárquicas da tribo, entre outros aspectos, a inserção de Camila e Guilherme, trinta anos depois, atualizou e reforçou cada ponto. Mas agora levando em conta também outras variáveis, tais como a chegada do complexo hidrelétrico de Belo Monte, que transformou - ou como Viveiros salienta, transtornou - a vida dos povos tradicionais do médio Xingu.
Uma parte do livro, portanto, foi escrita levando em consideração os anos de 1981-1983, e a outra de 2011-2013, permitindo uma visão histórica e comparativa com a contribuição dos três antropólogos. No contraste entre os dois momentos, Viveiros destaca no prefácio da nova edição o fato de ambos se localizarem em pontos de inflexão ou "catástrofe" na história do contato dos Araweté com o Estado Nacional. "Mas os Arawaté têm sabido, até agora, resistir, ou, como prefiro escrever, rexistir em sua singularidade com admirável resiliência", observa.
Image-1-Artigo-2271557-1
Pesquisas
Viveiros de Castro obteve autorização para visitar a aldeia no início dos anos 1980, após um ano e meio de negociações com equipes da Funai, à época comandada por militares. Entre 1981 e 1992, o antropólogo esteve por diversas vezes na aldeia do grupo, situada no igarapé Ipixuna, para estudar sua cultura. Nesse período, eles já haviam recuperado parte de seu número de habitantes, que quase foram dizimados por doenças no percurso realizado nos anos 1970 em direção a um dos postos da Funai.
"Morei com os Araweté por dois meses em 1981, nove meses em 1982-1983, um mês em 1988, um mês em 1991 e um mês em 1992", conta o antropólogo. É de 1992 a primeira edição do livro, em um esforço de adaptar o texto original (sua tese de doutoramento) a leitores não especializados que demonstraram grande interesse pelo modo de vida daquele povo.
Durante os anos 2000, ele não teve permissão para entrar na área, devido à presença de missionários evangélicos na região. Em 2010, conseguiu autorização para que dois de seus alunos - Camila de Caux e Guilherme Orlandini Heurich - entrassem na área para desenvolver novas pesquisas com os Araweté. E dessa conquista mais recente saltam os dois capítulos acrescentados na nova edição: "Casas, pátios e aldeias", de Camila, e "Cantos e mercadorias', de Guilherme.
Transformações
Enquanto Camila se debruça sobre o padrão de residência e as relações em comunidade, constatando uma multiplicidade de aldeias distribuídas por uma vasta extensão territorial, e com diferentes graus de relação entre si, Guilherme se aprofunda no estudo do canto e na presença dos bens estrangeiros entre eles, tais como pen drives e caixas de som, com os quais se fazem usos rituais.
Esses textos, acompanhados por belas fotografias, facilitam a compreensão do que se está sendo discutido. "A inclusão de imagens que registram os dois momentos da vida dos araweté separados por trinta anos pode dar uma ideia melhor ao leitor do que mudou visivelmente nessa vida, nos dois sentidos que se pode dar ao advérbio. Mas o visível (por nós) é uma pequena parte do mundo araweté", admite Viveiros.
Livro
Araweté: um povo tupi da Amazônia
Eduardo Viveiros de Castro, Camila de Caux e Guilherme Heurich
Edições sesc
2017, 228 páginas
R$70
 
Diário do Nordeste

Comentários