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Fotógrafa faz ensaio com crianças autistas em TCC de Jornalismo em Fortaleza

Por Crisneive Silveira
Diante da lente, vida. Família, riso, bolha de sabão, chamego do cachorro e muito, mas muito afeto. É o que se vê no “Olhar através e além do Autismo”, ensaio fotográfico feito pela jornalista Larissa Feitosa, de 22 anos. Delícia de João, Doce Lucas, George, o Curioso, Flor de Liz e seus familiares mostram que há muito além de um diagnóstico difícil, de uma rotina de descobertas e aprendizados. As fotos foram resultado do trabalho de conclusão do curso de Jornalismo na Universidade Federal do Ceará (UFC).
Uma vontade, e a câmera virou instrumento de luta, de quebra de paradigmas. Larissa decidiu trabalhar o tema na reta final da faculdade de Jornalismo por conta do irmão paterno, Wendel Ripardo, que tem a Síndrome de Asperger, classificada como autismo leve.
“Meu primeiro contato foi por causa dele. Ele parecia uma criança típica, mas depois deu sinais. Falou muito tarde, a gente falava e parecia que ele não ouvia, não obedecia regras sociais… Minha madrasta dizia que ele tinha algum problema, mas todo mundo dizia que era coisa da cabeça dela”, relembra a fotógrafa, que dividia com a madrasta, Conceição Ripardo, a angústia pela falta de diagnóstico do irmão.
O Autismo é uma síndrome comportamental. Dificuldade de interação social, na qualidade e quantidade da comunicação, além da manifestação de padrões inadequados de comportamento são os três pilares básicos para diagnosticar o autismo.
João vira super herói, Lucas mergulha na diversão, George bagunça no meio da sala e Lis faz careta para o preconceito. Assim, as quatro crianças junto aos familiares foram clicados por Larissa.
“O autista sempre foi retratado como indivíduo frio, incapaz de se comunicar, que não gosta de abraço, que é isolado no mundo dele. Sempre via ensaio fotográfico com aquela coisa melancólica, com viés negativo. Quis mostrar o contrário. Eles são muito mais que um diagnóstico ou a falta dele. Não tenho intuito de romantizar, mas mostrar o quanto é importante a família realmente engajada”, diz a fotógrafa.
As famílias logo toparam o ensaio para mostrar o lado afetivo e dar visibilidade a causa. Afinal, além do preconceito da sociedade por desconhecer a síndrome, é comum a dificuldade no diagnóstico.
“Essas crianças precisam ser vistas, inseridas. Meu irmão disse para minha madrasta assim: ‘Eu queria ter um amigo, eu não consigo conversar com os meninos da minha idade’. É difícil até pro atendimento de saúde. Não são todos os psiquiatras que conseguem diagnosticar. É uma luta bem complicada.”
“Vou falar, mas já estou com os olhos cheios d’água”, revela Janielle Severo, mãe do serelepe Lucas. Ela conta que teve dificuldade para chegar ao diagnóstico do filho, pois, assim como a maioria das pessoas, tinha a visão de que o autista era completamente alheio ao mundo. “Nunca me passou pela cabeça. Meu filho me olhava, me beijava, abraçava…”
Janielle chegou à Larissa através da FAZ (Fortaleza Azul), uma associação formada por familiares de pessoas com autismo, que promove conscientização e inclusão social. A mãe do Lucas ressalta a relevância do trabalho.
“É importante para desmitificar essa ideia de que autista não ama. Ele gosta de contato, de brincar com outras crianças, mas tem dificuldade em expressar os sentimentos. Algumas fotos mostravam o olhar de amor, de curiosidade… As fotos, às vezes, conseguem passar o momento. A fala pode não existir, mas o corpo transmite, mesmo através do olhar”.
Se as crianças sorriram na alegria de brincar, Larissa mostrou sensibilidade ao retratar com delicadeza e sem pieguice momentos bonitos das crianças. Cada uma com seu mundo fazendo parte do nosso mundo. Inseridas, integradas. “Achei tudo tão bonito. Autista é uma criança como qualquer outra, ama como qualquer outra, mas tem algumas dificuldades mais específicas. É importante para ser mais falado, discutido e para as pessoas entenderem”, disse Janielle.
Sobre o resultado do trabalho e o que espera dela, a fotojornalista mostra certa modéstia mas, como resultado, espera que um novo “Olhar através e além do Autismo” seja lançado. “Acho até audacioso, mas espero que ajude a verem que essas crianças existem. A sociedade precisa saber recebê-las respeitando as limitações e as capacidades delas”, conclui.

Tribuna do Ceará

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