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Juventude na escola: muito potencial, pouco aproveitamento

Criativos, com alta capacidade de articulação e engajamento, os jovens mostram que são capazes de promover mudanças. A ampliação de espaços e práticas que canalizam essa energia podem promover impactos na escola e nos estudantes, aponta estudo
Por: Laís Semis
Em 2016, estudantes no Rio de Janeiro ocuparam as escolas e as ruas contra cortes na Educação e a Reforma do Ensino Médio. Crédito: Tânia Rêgo/Agência Brasil
O potencial de mobilização dos jovens é grande, mas ainda é subestimado e subutilizado pela sociedade. Esse é um dos indicativos da pesquisa “Novos fluxos na busca por oportunidades: Trajetórias de jovens nas periferias da cidade”, da Fundação Itaú Social, que destaca a relação dos estudantes com o território escolar. De autoria de Fernanda Zanelli, gestora de projetos socioculturais para juventudes, a publicação traz um panorama sobre a formação das periferias e indica alguns elementos que são a chave para novas experiências.

A escola é um deles. O espaço de aprendizagem é importante também para socialização, articulação sobre temas e grupos e para desenvolver o protagonismo estudantil. É nela que as relações e as primeiras redes de apoio, para além da família, geralmente se formam, segundo a pesquisa. “Dentro dessa rede, os estudantes podem dar sua opinião sobre diferentes temas, dialogar, desenvolver projetos e ter contato com novidades”, diz Fernanda Zanelli. Como uma agregadora de oportunidades, onde se formam relações de confiança (amigos) e vínculos indiretos (conhecidos), a escola é um caminho para apresentar possibilidades de experiências diversificadas e externas à escola, ampliar os espaços da cidade ocupados pelos jovens da periferia e as possibilidades de Educação e trabalho. “É por meio dos pares que a novidade é legitimada e muitos têm conhecimento sobre cursinhos pré-vestibulares, cursos gratuitos, coletivos e ONGs que podem colaborar para sua formação ou ingresso no mercado de trabalho”, explica a autora. 

A força da juventude
É principalmente a partir da escola e de redes online que os jovens se articulam. Um exemplo muito simbólico foram as ocupações secundaristas. “Quando eles se manifestam com frases como ‘A escola é nossa’, isso mostra o papel que ela ocupa na vida dos estudantes e na comunidade”, analisa a autora. “Existe uma demanda por produção de projetos e atividades por parte dos jovens. Os saraus, oficinas e aulas realizadas nas ocupações mostram isso. Quando a  escola opta por canalizar isso, tudo fica diferente”, diz.

Ocupação do Centro de Educação Tecnológica Paula Souza, em São Paulo. Crédito: Rovena Rosa/Agência Brasil
A publicação reflete sobre outros episódios de mobilização que apontam o poder de participação e protagonismo da juventude, como os protestos de junho de 2013 contra o aumento das tarifas de transporte, o "rolezinho" no Shopping Metrô Itaquera, na zona leste de São Paulo, e as ocupações dos secundaristas. Nesse contexto de manifestações juvenis que ganharam a pauta nacional, Fernanda afirma que embora a escola reconheça que os estudantes têm a contribuir, essa energia é pouco aproveitada.

A escola pode mais
Durante o Ensino Médio, Thamires Vieira de Mello, 20 anos, estudante de cinema ex-aluna da rede pública de São Paulo, viveu a experiência de ser representante de sala. A expectativa era simples: aproximar o diálogo com a gestão e aproveitar um palco que não era utilizado na escola para promover um debate. No entanto, ela ouviu um "não" por parte da direção. “Naquele momento, vi que tínhamos um certo peso como estudantes da escola, mas a diretora se colocou numa posição de autoridade e não conseguimos negociar”, relata. Os professores foram omissos e o espaço continuou ocioso. “A escola é um espaço de difusão de ideias que podem gerar enfrentamento ou estabelecer parcerias para ações melhores para todos”, considera Thamires. 

Para a gestora Fernanda Zanelli, ao desconsiderar os jovens na resolução de desafios do dia a dia da escola e de políticas públicas perde-se potencial de engajamento e inovação. “Essa criatividade juvenil poderia trazer respostas sobre como superar obstáculos da vida acadêmica e profissional. O que é o fazer colaborativo, engajamento e criatividade senão o debate de inovação no mundo?”, diz. 

Ações de gestão democrática, que envolvam os alunos nas discussões e decisões, como assembleias e comissões - espaços em que os estudantes são convidados a refletir sobre processos, problemas e fazer parte das soluções -, podem fazer da escola um espaço de maior pertencimento, melhor convivência e mais oportunidades de desenvolvimento. “São muitas portas possíveis de serem abertas nesse processo, ainda mais quando se tem uma rede que auxilie a fazer escolhas mais conscientes e em melhores condições”, defende Fernanda. Na visão da autora, falta um fluxo sustentável para encaminhar as demandas da escola, encaminhá-las e absorvê-las. “Isso precisa estar inserido numa rotina para não ser algo efêmero”. 

Entre as principais recomendações do estudo para políticas e programas voltados para a juventude estão o reconhecimento de que precisa ser diversa; o apoio para que jovens se sintam seguros em explorar novos territórios e ousar novos olhares; levar a sério o protagonismo juvenil não como consultivo, mas na perspectiva de construção conjunta; ampliação de programas de aprendizagem; aproximar os serviços públicos do jovem; reconhecer as inovações já em curso desenvolvidas pela juventude e articulação entre as diferentes políticas sociais.

Nova Escola

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