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Novo livro sobre a vida do cantor e compositor Belchior conta um dos períodos em que ele viveu no sítio do amigo Jorge Cabral

Obra traz fragmentos de parte do período em que o cantor exilou-se longe dos holofotes
O início do livro já alerta: "Esta é a minha história com Belchior", ressalta Jorge Claudio de Almeida Cabral logo na apresentação de "Belchior - A História que a Biografia Não Vai Contar", lançado no Ceará no último mês de novembro. O advogado, que recebeu o cantor e compositor em sua casa no ano de 2013, conta no livro sobre um dos momentos de reclusão do artista.
Morando no Rio Grande do Sul, Jorge Cabral foi até as cidades de Tianguá, Sobral - terra natal de Belchior - e também veio a Fortaleza (no Centro Cultural que leva o nome do "rapaz latino americano") para promover a obra.
Na capital cearense, o autor recebeu proposta de uma livraria para vender alguns exemplares, mas ainda sem parceria oficialmente confirmada. Mais à frente, Jorge pretende voltar ao Ceará para visitar Coreaú, a convite do prefeito do município. Na ocasião, o escritor-advogado deve fazer escala na Capital e quem sabe fazer um relançamento da publicação.
"A informação que tu recebe ela vem e vai embora se tu não a utiliza. Agora o sentimento que tu recebe de alguém, esse fica pra sempre e foi esse sentimento que coloquei no livro", explica Jorge Cabral, advogado e escritor, que custeou toda a produção do livro - que pode ser adquirido pela página oficial do projeto no Facebook ("Belchior - A História que a biografia não vai contar"/ R$ 40).
O livro é um relato de Cabral sobre os momentos que compartilhou com o "famoso que se tornou retirante da sociedade". A obra não é uma biografia, conforme deixa claro o autor no prólogo - prativamente uma carta dedicada a Belchior, emocionante; na verdade, o livro inteiro surge nesse tom.
Contexto
Mas se você espera alguma resposta sobre os misteriosos últimos anos de Belchior, ficará frustrado. O cantor era discreto quanto ao motivo de seu afastamento voluntário dos holofotes e não comentava com ninguém essa decisão. Segundo Cabral, pedir para que ele cantasse alguma de suas músicas ou apenas tocasse era proibido. Durante o tempo em que ficou em sua solidão, frisa, Belchior mantinha-se misterioso e incógnito, até para os que o acolhiam. Já na capa o cantor e compositor é homenageado. Elaborada pelo cearense Cícero Almeida, a ilustração mostra o sítio cedido por Jorge a Belchior. Nos primeiros capítulos, o autor conta como o músico chegou em sua casa, sobre o primeiro encontro com o cantor e também relata os últimos dias do artista, em uma narrativa emocionante.
Essa característica, aliás, é mantida por Cabral ao longo das 232 páginas. Um dos momentos mais tristes para o leitor é quando Jorge revela os problemas financeiros então enfrentados por Belchior. "Ele nunca pedia nada, mas dependia da doação de dinheiro e de comprar que os amigos lhe davam", recorda. A busca por casas, no sul do País, também era através de favores. O que levou a Belchior a escolher essa vida? Não se sabe.
O terceiro capítulo, é dedicado ao dia anterior à morte de Belchior. Ele e a esposa, a convite de Jorge, foram passear em uma livraria. Essa foi a última aparição pública do cantor.
A vida do "trovador cearense" não estava das melhores. Embora nitidamente sem dinheiro, negava-se a voltar aos palcos. Jorge comenta isso em seu livro: "Belchior estava nos últimos dez anos vivenciando as letras de suas músicas, e não vivendo delas".
Entre prosa e poesia, feitas pelo próprio Jorge como homenagem ao amigo, o livro é uma mistura da vida dele e de Belchior. "Sou coadjuvante da minha própria história e Belchior passa a ser o personagem principal da minha própria história. Essa é a dinâmica do livro", explica.
É fácil imaginar o cantor vivendo aquele cotidiano de simplicidade, e a fluidez da escrita de Cabral ajuda o leitor a imaginar a figura do cantor nesse contexto de maneira eficiente. Mas além do estilo, o autor lança mão de outro recurso, mais "tecnológico": o QR Code, tipo de código de barras para dispositivos móveis como smartphones.
Ao usar o aplicativo de leitura para "ler" o código, o leitor tem acesso a vídeos do arquivo pessoal de Jorge em que Belchior aparece.
aConversas
O autor é categórico em dizer que Belchior, além de deixar lições na área cultural, também deixou um aprendizado para os demais sobre aquela autorreclusão. Neste momento as conversas eram a melhor companhia. Como diz nos livros: "Não estávamos jogando conversa fora, estávamos jogando conversa na cabeça".
Assim como os dois falavam de diversos assuntos - desde "o micro ao macro, do átomo às galáxias, pelo Universo fomos, de Einsten até as equações desconexas da física quântica" - Cabral também não prende a um único tópico os dias em que compartilhou um pouco de sua vida com Belchior.
Essa experiência é contada no livro também pelo olhar de fã de Cabral, e não apenas pelo olhar do anfitrião. No capítulo batizado "O Cajado", ele trata desse presente dado ao compositor.
"O cajado tem uma figura emblemática, filosofal, profética. Peguei minha máquina e fiz um cajado, envernizei e dei a ele. Neste capítulo falo sobre a reflexão filosófica do que aquele presente representou para Belchior até o momento em que ele precisou se desfazer (do objeto). Vi a tristeza em seu olhar", conta.
Obras
Durante 2017 algumas obras que retratam a vida do cantor e compositor cearense foram lançadas, como forma de homenageá-lo. Uma, em especial, foi lançada em 2016, com Belchior ainda em vida, e relançada após a sua morte.
"Para Belchior com amor", organizado por Ricardo Kelmer, reúne crônicas, contos e cartas, a partir da mistura entre realidade e ficção. Ao todo, 14 escritores cearenses participaram do projeto.
Já a biografia "Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano", do jornalista Jotabê Medeiros, entrou no mercado em setembro de 2017, cercada de polêmica. Ângela Belchior, irmã do cantor, chegou a divulgar uma nota criticando a forma como o livro foi feito, alegando falta de veracidade em algumas informações.
"A biografia do Jotabê é bem didática, seguindo uma ordem cronológica, mas ele não o conheceu. Eu conhecia um pouco, mas não conhecia a intimidade, mas o olhar de cada autor sobre seu personagem muda conforme o escritor. Ele ouviu relatos, confiou no que falaram pra ele", comenta Jorge.
Agora a irmã de Belchior está com planos para ela mesma escrever uma biografia sobre irmão. Com o possível título está "Vida e obra, da forma ao exílio - quero lhe contar tudo o que aconteceu comigo". A previsão de lançamento varia entre o início de 2018 e para 27 de outubro, data de aniversário do cantor.
 
Diário do Nordeste

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