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Conheça projetos em Belo Horizonte que promovem a valorização da leitura

Arquivo EM
Mário de Andrade e a correspondência com escritores e artistas são temas no Chá com Letras, nesta teça-feira (27), na Idea Casa de Cultura. (foto: Arquivo EM)
Na atualidade, a literatura divide espaço com diversos meios de entretenimento de acesso fácil e satisfação imediata. Isso, somado à baixa cultura literária do brasileiro, resulta em uma população adulta que lê pouco e não se esforça em propagar o hábito para as novas gerações. No entanto, em Belo Horizonte, há diversas iniciativas que buscam reverter esse cenário a partir de experiências de troca. Esta semana, dois desses encontros celebram a literatura de forma conjunta em Belo Horizonte.

Há 10 anos, as rodas de leitura realizadas pela Biblioteca Pública Infantil e Juvenil compartilham textos literários e incentivam, na prática, o contato com obras literárias. O projeto reúne voluntários, que, após um encontro de preparação, apresentam textos e fazem leituras expositivas em voz alta para um público agendado, geralmente, na última quarta-feira do mês. Além de escolas, que organizam excursões ao local, a ação recebe também público universitário e jovens cumprindo medidas socioeducativas.
Técnico em literatura da biblioteca, Samuel Medina é um dos coordenadores da roda de leitura e do encontro de contadores de histórias. “As ações propõem o retorno do hábito da leitura como um momento de encontro. Considerando o desenvolvimento mercadológico do livro ao longo do tempo e também o processo de alfabetização, percebemos que a leitura passou a ser feita silenciosamente, de forma recolhida”, observa, defendendo o resgate dos serões, em que “uma pessoa lia em voz alta um livro ou um jornal e a família se reunia para ouvir”.

Nos encontros, são trabalhadas diferentes formas de expressão da literatura. Assim, textos teatrais e livros ilustrados não ficam de fora das rodas de leitura. A acessibilidade também é uma preocupação dos participantes. “Como um livro de imagens pode ser lido para uma pessoa com deficiência visual? Essas questões são abordadas e discutidas nas leituras experimentais junto com as discussões dos textos”, conta Samuel.

FORMAÇÃO Segundo pesquisas, adultos leem menos que crianças e adolescentes. A prática, bastante associada ao processo de escolarização, costuma ser abandonada pelas pessoas ao encerrarem os estudos. Atento a esse cenário, Samuel propõe que o olhar seja direcionado ao processo de formação de novos leitores ainda na infância. “Na roda de leitura, convidamos o público infantil a acompanhar o texto com uma fruição que propicia um momento agradável, de prazer. Fazemos uma espécie de propaganda da leitura e do livro”, afirma o técnico, que destaca a importância da construção de imagens interiores e projeções simbólicas. Assim como as artes plásticas, a literatura requer um esforço maior, um compromisso e uma cumplicidade que vão além da função de espectador”, diz Samuel.

Segundo Samuel, a literatura deve ser vista como um ato de liberdade e faz parte do processo de educação estimulá-la de forma prazerosa. Nesse contexto, ele observa a importância da literatura popular infantojuvenil. “Por mais que eu ofereça o que eu acho bom e importante que eles conheçam, os jovens precisam exercer suas próprias escolhas. Literatura imposta não é literatura. Você não vai construir imagens se não tiver interesse e atenção ativa para aquilo”, defende.

Para Samuel, as novas mídias e tecnologias não devem ser vistas como rivais da leitura, mas aliadas. Como exemplo, ele cita a difusão de crônicas e poesias através do WhatsApp e a possibilidade de os usuários das redes sociais produzirem seus próprios conteúdos. “As pessoas estão escrevendo mais – o que não quer dizer que estão escrevendo bem.” Doutora em literatura, a professora Maria do Rosário Alves Pereira concorda, apostando na coexistência dos vários meios. “Uma pessoa pode se interessar pelos estudos literários e também pelos novos formatos de arte e comunicação. Afinal, ainda que efêmeros, esses meios atendem ao nosso cotidiano com uma praticidade que, inclusive, dá a tônica das próprias relações humanas”, afirma.

CARTAS Maria do Rosário participa da edição de hoje do Chá com Letras, projeto de fomento dos estudos literários promovido periodicamente pela Idea Casa de Cultura. Ela analisa cartas trocadas pelo escritor Mário de Andrade (1893-1945) com artistas de sua época – incluindo um acervo inédito disponibilizado pelo Instituto de Estudos Literários (IEB), da USP.

O bate-papo promoverá um amplo panorama do cenário cultural brasileiro na primeira metade do século 20. Terão destaque textos trocadas por Mário de Andrade com as escritoras Henriqueta Lisboa e Oneyda Alvarenga. “A carta como documento histórico e cultural traz uma série de vestígios acerca dos escritores, que muitas vezes nós não conseguimos vislumbrar em seu arsenal de obras publicadas. Para além do aspecto da privacidade – já que pressupõe apenas dois interlocutores –, essas cartas alcançam dimensão pública, pois refletem aquele tempo”, afirma.

A professora defende que as cartas eram o laboratório do escritor, em que Mário dialogava com os novos artistas da época – que o enxergavam como um patrono da vida literária. Fernando Sabino (1923-2004)foi um dos que recorreram ao veterano, para opinar a respeito de sua primeira obra, escrita aos 18 anos. “Mário promovia uma espécie de modelagem desses escritores, traçando um percurso de obras que eles deveriam ler. De uma forma geral, começava pela literatura brasileira e latina e só depois seguia para a literatura estrangeira”, revela Maria do Rosário.

O encontro aborda ainda correspondências assinadas pelas artistas plásticas Tarsila do Amaral (1886-1973) Anita Malfati (1889-1964) endereçadas ao escritor. Maria do Rosário ressalta que o Movimento Antropofágico fica muito claro nas primeiras cartas trocadas entre eles, além de elas reunirem informações sobre obras cruciais para o modernismo brasileiro, como Abaporu (1928), de Tarsila.

“É perceptível a participação fantasmagórica de Oswald de Andrade (primeiro marido de Tarsila) através do tom irônico de algumas cartas, algo que vai se esfacelando com o tempo, já eles se separaram nos anos seguintes”, observa Maria do Rosário. Já nas cartas escritas por Anita Malfati, é notório o quanto as fortes críticas que recebia na época impactavam seu fazer artístico.

Segundo Maria do Rosário, o objetivo do projeto é promover conversas pessoalmente sobre assuntos voltados à cultura. Ela afirma que o Chá com Letras costuma reunir não apenas um público intelectual, mas pessoas com diversos repertórios que, em diálogo, só têm a acrescentar uma às outras.

CHÁ COM LETRAS
As cartas de Mário de Andrade e sua importância como epistológrafo, com Maria do Rosário Alves Pereira. Mediação: Carol Barreto. Terça-feira (27), às 19h, na Idea Casa de Cultura (Rua Bernardo Guimarães, 1.200, Funcionários. (31) 3309-1518). Entrada franca, com retirada de ingressos a partir das 18h30.

RODA DE LEITURA EM VOZ ALTA E REFLEXÕES SOBRE LITERATURA
Mediação: Wander Ferreira e Samuel Medina. Quarta-feira (28), às 9h30, na Biblioteca Pública Infantil e Juvenil (Centro de Referência da Juventude, Praça da Estação, s/nº, Centro. (31) 3277-8658). Entrada franca.

Fonte: https://www.uai.com.br

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