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Caixa Cultural recebe peça em homenagem à escritora Clarice Lispector

FOTOS: CHRISTIANO NASCIMENTO/DIVULGAÇÃO
FOTOS: CHRISTIANO NASCIMENTO/DIVULGAÇÃO
Aos 22 anos, recém-saída da escola de teatro, Rita Elmôr estava decidida a levar Clarice Lispector (1920-1977) aos palcos. Sem dinheiro para tocar o projeto autoral, a atriz teve de vender o próprio carro para conseguir realizar a produção. Assim nasceu Que mistérios tem Clarice, um sucesso que rendeu para a paulistana radicada no Rio a indicação do Prêmio Shell de melhor atriz. A repercussão correu o País e, após três anos de intensa circulação entre 1998 e 2000, Rita resolveu tocar sua carreira além-Lispector. O laço entre as duas, porém, nunca se rompeu. Tanto que na próxima quinta-feira, Rita sobe ao palco da Caixa Cultural em novo trabalho sobre a autora de A hora estrela. A peça Clarice Lispector e Eu - O mundo não é chato faz curta temporada até domingo.
“Depois desse primeiro espetáculo, fiz outras peças, TV, cinema. Obviamente me afastei da Clarice, porque estava envolvida com outras coisas. Mas aí eu comecei a acompanhar um evento curioso: minha imagem sendo confundida com a dela. Vi numa banca, uma foto minha na capa de uma revista como se fosse ela. Ninguém me reconhecia ali”, conta Rita, em entrevista ao O POVO. Por mais que a atriz quisesse seguir, ao longo dos 18 anos que separam uma peça da outra, ela viu o vínculo com a escritora permanecer. “Os anos foram passando e essa coisa foi tomando uma proporção muito grande. O filho da Clarice me escrevia, me mandava edição de livro com a minha foto. Começaram a vender camiseta com a minha imagem, ímã de geladeira, caneca”, narra.
Foi a partir da permanência dessa confusão que a atriz reiniciou, aos poucos, um contato mais íntimo com a autora. “Essa associação começou a borrar a imagem dela e a minha. Isso começou a me perturbar um pouco e eu queira falar sobre isso, que estava cada vez mais forte”, explica. A artista, então, convidou o diretor teatral Rubens Camelo para iniciar um novo processo. A própria Rita criou uma dramaturgia que reúne trinta e seis recortes de textos de diferentes livros da autora. O foco dado é no lado “menos introspectivo” da escritora, em narrativas que revelam uma Clarice mais voltada ao mundo exterior e, consequentemente, num diálogo mais direto com questões políticas e sociais.
“Ler Clarice é aprender a observar a vida para além das aparências. Ela passou a vida olhando as pessoas e, a partir dessa observação, faz o leitor perceber as diversas camadas de um acontecimento, ela leva a gente para um exercício de aprofundamento das situações”, decanta Rita, esclarecendo de onde nasce a paixão pela autora. Para a atriz, mergulhar em Clarice permite suscitar novas leituras da vida ao redor. “Você começa a se relacionar com tudo a sua volta de maneira diferente. A obra dela mostra que se o pensamento tiver amortecido, não tiver vivo, a gente vai sempre repetir padrões”, continua. Para Rita, hoje aos 44 anos, é ainda mais fácil dialogar com a autora. “Na medida em que eu vivo, amadureço, vou entendendo Rita com mais profundidade”.


Clarice Lispector e Eu - O mundo não é chato não é um trabalho biográfico, não tem como objetivo contar a história de vida desas duas mulheres. A obra costura, a partir de um cenário minimalista, situações que saltam da literatura para dialogar com o agora. No caminho para pensar a construção dramatúrgica do espetáculo, a intérprete buscou também situações cômicas. “Dá para extrair humor falando de assuntos difíceis. Clarice consegue fazer rir e ao mesmo tempo nos deixar atônitos com uma situação. Eu persegui esse sentimento para que a peça não ficasse de uma nota só”. O intuito, ela detalha, é aproximar o público da obra de Clarice e tornar possível brincar com a fusão Clarice-Rita. “Por meio dos textos dela, falo sobre o desencaixe. No Brasil de hoje, muita gente tem se sentido como Clarice: desencaixada”, completa.
SERVIÇO
Clarice Lispector e Eu - o mundo não é chato
Quando: de quinta, 5, a sábado, 7, às 20 horas. Domingo, às 19 horas
Onde: Caixa Cultural (Avenida Pessoa Anta, 287 - Praia de Iracema)
Quanto: R$ 10 (inteira)
Telefone: 3453 2770

CONFUSÕES ENTRE AUTORA E ATRIZ
MEMES
Rita Elmôr é quem estampa muitas das imagens que circulam com frases atribuídas a Clarice Lispector nas redes sociais. “A foto não é dela e nem a frase. É quase uma metáfora de como as aparências enganam”, brinca a atriz.

PRODUTOS
De camisetas, canecas e imãs de geladeira a capas de revistas e outras, são muitas as trocas de imagem entre as duas. Até em propaganda de TV, Rita já se viu por engano, equívoco que se repete com frequência em publicações nacionais e internacionais.

“HOMENAGENS”
A Prefeitura do Rio de Janeiro também já confundiu Rita e Clarice. No dia do aniversário da autora ano passado, a foto usada foi da atriz em cena. A confusão também chegou a matérias de jornal sobre os 40 anos de morte dela, data lembrada em muitos veículos em 2017.

RENATO ABÊ
O Povo

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