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Dia da consciência negra: quando o luto é luta

As estatísticas seguem duras e nada animadoras. Somente na última década, a taxa de homicídios de negros - pretos e pardos - cresceu 23%, de acordo com dados do Atlas da Violência. "Histórias, registros/ Escritos/ Não é conto/ Nem fábula/ Lenda ou mito" já sentenciavam, em 2002, os versos de Negro Drama (Racionais MCs).
Por outro lado, "a carne mais barata do mercado" é a mesma que tem demonstrado força ímpar no combate ao racismo e à intolerância, sobretudo religiosa, e ao tornar-se pauta em diversas áreas, especialmente relacionadas à arte. 2018 foi, sim, um ano de perdas - como a da deputada carioca Marielle Franco -, mas também de produções como Pantera Negra, de Childish Gambino (do clipe This is America), de Rincon Sapiência, Iza, Luedji Luna, Elza Soares (Deus é mulher) e quem mais soube ser a própria história.

"Tenho acreditado cada vez mais que estamos nos fortalecendo e caminhando de forma mais articulada. É perceptível que movimentos e ações estão sendo realizados na Cidade. De uma reunião nas calçadas das favelas até uma manifestação, estamos por todos os lugares. Se formos pensar numa historiografia de representação negra, ela sempre existiu e sempre se pautou fortemente. A questão é por onde e quais circunstâncias utilizamos para balizar se hoje ou ontem a representação está mais forte. Para mim, é muito mais profundo discutir representatividade negra, ainda mais frente aos circuitos arquitetados a exterminar, propositalmente, um espaço de fala e um arcabouço vivencial rico de pensamentos e ações", afirma Wellington Gadelha.


Integrante do coletivo Natora e artista da dança "com os pés fincados na ancestralidade". "Tenho cada vez mais pautado meu trabalho e ações junto à rede de coletivos de favela como ações de articulação e fortalecimento interiorizado. Acredito que temos de descentralizar e interiorizar processos de aquilombamento cotidianamente. Da nossa casa aos corres diários, é propor, pensar e fazer uma colcha de retalhos onde as linhas são nossas concepções, nossas visualidades, nossas danças, nossos corpos. É tendo a arte e a cultura como frente de cuidado e resistência que construímos um lugar-grito, lugar-rito, lugar-útero", discorre Wellington.
Pedagoga, cantora e escritora, Patrícia Matos enxerga nos movimentos sociais a responsabilidade em boa parte desse protagonismo, "tensionando o estado brasileiro no combate ao racismo, trazendo para a cena pública o debate sobre racismo institucional, genocídio da juventude negra, assim como a violência religiosa que os povos tradicionais de matriz africana sofrem cotidianamente. O movimento negro brasileiro, assim como os povos tradicionais (Umbanda e Candomblé), têm seu sistema educacional, muito embora não considerado formal, mas que suscita o debate sobre pertencimento e empoderamento cuidando e educando nos terreiros. O Educar na Escola, nesse sentido, ainda não se efetivou, infelizmente", afirma.
Neste Dia da Consciência Negra, temos o que, de fato, celebrar? "Penso que sim. Porém, não devemos nos acomodar. Queremos e temos o direito de querer mais. O 20 de novembro é um momento de reflexão. Temos a obrigação de continuarmos lutando para derrubar as barreiras construídas pelo racismo. Alguns direitos básicos de cidadania ainda nos é negado. Enquanto existir racismo, algo faltará para nós", sinaliza Hilário Ferreira, professor universitário. "Muito ainda falta ser feito: emprego, saúde, educação, lazer, estado laico de direito, respeito e reconhecimento de nosso legado, nossas tradições. O movimento antirracista nos faz transformar o luto em luta", complementa Patrícia Matos.
"Gosto de pensar celebração como espaço de encontro, de partilha e de construção de uma consciência organizativa e crítica. Celebração como um instante temporário de criação e fruição que reverbera e vai se alastrando. Instante de sensibilização e de entendimento que mudança nenhuma poderá nos conciliar. Eis o desafio: como manter essa teia fina e potencialmente frágil na sua estrutura? A memória dos que já foram e dos que ainda estão é importante, a valorização das ervas e da cultura do nosso povo é importante. A articulação e fortalecimento preto genuíno é importante. Temos consciência", conclui Wellington.
PROGRAME-SE 
PASSEIO PÚBLICO
O quê: IX Memórias de Baobá: Pertencimento, Espiritualidade e Educação
Quando: 20 a 24/11
Onde: Praça dos Mártires/ Passeio Público (rua Dr. João Moreira, s/n - Centro)
Informações no link 
BOSQUE DOS FERROVIÁRIOS
O quê: Roda de conversa com Mãe Zimá, Pingo de Fortaleza, Ivaldo Paixão, Praxedes, Bernardo, Carlos Brito, Cláudio Correia, Pai Gerson, Pai Júnior de Yemanjá, Mãe Kelma de Yemanjá e Pai Enerval do Zé Pilintra; e os mestres de batuque Jair, Pasconith, Germano e Kanu (mediação: Téo Lima)
Participações: grupo musical Na Quebrada do Coco e Capoeira do Mestre Índio
Quando: hoje, 20, às 19h
Onde: Bosque dos Ferroviários (entre as av. Bezerra de Menezes e José Jatahy - Farias Brito)
Info: (85) 9 8898 0766
UECE (ITAPERI)
O quê: III Seminário Afrocearensidades: Enfrentamento do Racismo na Década dos Afrodescendentes
Quando: amanhã, 21, das 8h às 21h
Onde: Auditório Central da Uece (av. Dr. Silas Munguba, 1700 - Itaperi)
Informações no link 
CENTRO CULTURAL BELCHIOR
O quê: Cine Afro com a exibição de Candomblé, um legado africano (14h); Capoeira Angola Orun Aiyê, de Mestre Magnata (17h); e Tambor das Marias da Casa de Mestre Felipe (19h)
Quando: hoje, 20
Onde: Rua dos Pacajus, 123 - Praia de Iracema
PRAIA DO LIDO
O quê: Programa Cafuné com DJ Guga de Castro e FM Beach Park com Luedji Luna (17h), Maracatu Kizomba (18h/ Largo Luís Assunção); Coletivo Mulamba com Mayara Mota e Darwin Marinho (19h); show de Luedji Luna (20h)
Quando: amanhã, 21
Onde: Praia dos Crush (Praia de Iracema)
CENTRO CULTURAL GRANDE BOM JARDIM (CCBJ)
O quê: Campanha "Novembro de Todas as Cores" com Formação Permanente "Reflexão acerca do pensar a consciência negra com um aspecto constitutivo da identidade real e democrática da sociedade em que vivemos (14h); e visita guiada para educadores sociais ao Planetário do Dragão do Mar (16h)
Quando: hoje, 20
Onde: Rua Três Corações, 400 - Bom Jardim
Informações no link 
BIBLIOTECA CRISTINA POETA
O quê: Palestra e roda de conversa com o professor Charles Odevan sobre "Africanidades Mitos e Ritos: Conhecer para Empoderar".
Quando: hoje, 20, das 14h às 15h30
Onde: rua Raimundo Ribeiro, 580 - Autran Nunes
CENTRO DRAGÃO DO MAR
O quê: espetáculo Devoração - Como Permanecer Fortes?, da Companhia da Arte Andanças
Quando: 22 e 29/11, às 20h
Onde: Teatro Dragão do Mar (rua Dragão do Mar, 81 - Praia de Iracema)
Quanto: R$ 10 (inteira)
Classificação: 14 anos
Info: (85) 3488 8600
CUCA MONDUBIM E JANGURUSSU
Quando: hoje, 20
Onde: Cuca Mondubim - Roda de Conversa sobre Consciência Negra (9h) / Cuca Jangurussu - Abertura da Semana do Hip Hop (18h) e Baile Jangu Por Nós (19h)
Informações no link 
BIBLIOTECA HERBÊNIA GURGEL
O quê: Painel expositivo com amostra de imagens e livros temáticos sobre a cultura negra
Quando: de 20 a 30/11
Onde: Rua 531, nº 25 - Conjunto Ceará (2ª etapa)
TURURU (CE)
O quê: Encerramento da 1ª Gira Cênica - Encontro/Imersão de Artistas e Pesquisadores Negr@s Cearenses com Missa Afro em tributo a Zumbi dos Palmares
Quando: hoje, 20, às 19h
Onde: Igreja da Comunidade Quilombola de Conceição dos Caetanos (Tururu/CE)
Informações no link 
O Povo

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