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Barragem de rejeitos: qual a responsabilidade internacional?

Por André de Paiva Toledo*
As barragens de rejeitos de mineração têm sido utilizadas de maneira abrangente como alternativa economicamente interessante de destinação de sub-produtos da atividade mineradora. Uma vez construídas, há a expectativa de que essas barragens durem por muito tempo. Contudo, como toda obra humana, as barragens devem ser objeto de manutenção constante e vigilância contínua para que seja garantida a perenidade de suas instalações e, por consequência, realizada a prevenção de danos socioambientais decorrentes do comprometimento estrutural. Apesar disso, desde a década de 1970, no mundo, ocorrem anualmente de dois a cinco rompimentos de barragens de rejeitos, o que faz da questão um desafio global.
Os eventos de rompimento de barragem de rejeitos têm algumas causas bem identificadas. Os rompimentos dão-se, normalmente, por causa de imprevistos no processo de sedimentação de material pesado oriundo do enchimento da barragem; em virtude do aumento da quantidade represada de outros tipos de material, advindos das correntes de águas pluviais; porque falta regulamentação e fiscalização dos critérios de projeção das estruturas; em razão da ausência de requerimentos de estabilidade, em vista do monitoramento contínuo do funcionamento da barragem, desde a construção até a operação; e em decorrência do alto custo do trabalho de manutenção das barragens de rejeitos da mineração depois do fechamento das minas. Percebe-se, assim, que a omissão legislativa por parte do Estado, associada à tentativa de minimização de custos de produção por parte das empresas, são os dois pilares sobre os quais sustentam-se as causas de rompimento da barragem de rejeitos. 
Independente de sua causa, quando há o rompimento de uma barragem de rejeitos, sucedem-se inúmeros danos socioambientais, que se resumem em morte e poluição. Diante desses fatos danosos, procura-se identificar, no âmbito interno dos Estados, a quem recai a responsabilidade penal, civil e administrativa. Porém, em face de pressões econômicas e políticas, tendo em vista que os interesses do Estado e de grupos empresariais públicos e privados costumam, nessas horas, confundir-se, a responsabilização interna torna-se, de fato – e, em certos casos, de direito –, impossível por negligência ou conivência, por omissão ou ação.
Diante da impossibilidade fática ou jurídica de responsabilização, o que pode fazer o indivíduo, que sofreu um dano decorrente do rompimento de barragem de rejeito? A última alternativa é demandar a responsabilização internacional.
Contudo, para que isso aconteça, deve existir o engajamento prévio do Estado com estruturas normativas internacionais, seja para responsabilizar-se em nome próprio, seja para possibilitar a responsabilização penal internacional de outros indivíduos. No primeiro caso, a responsabilização é decorrente da jurisdição dos tribunais internacionais de direitos humanos, em casos de violação do direito à vida, à integridade pessoal ou à propriedade por parte do Estado. No que concerne ao Brasil, por exemplo, desde 1998 o País reconhece soberanamente a jurisdição contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos, sediada em São José da Costa Rica. No segundo caso, a responsabilização é decorrente da jurisdição do Tribunal Penal Internacional, sediado na Haia, Holanda, em casos de cometimento de ecocídio por parte de pessoas físicas.
E a responsabilização internacional das pessoas jurídicas ou empresas? Eis um dos enormes vãos do direito internacional público. Não há um tribunal internacional, universalmente constituído, que seja competente para julgar empresas por danos socioambientais decorrentes de rompimento de barragem de rejeitos.
*Doutor em Direito pela Université Panthéon-Assas Paris 2. Professor do PPGD da Dom Helder Escola de Direito

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