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O direito de dizer que não é não

O direito de dizer 'não' àqueles que de alguma forma tentam impor suas vontades sobre a do outro
Mulheres usam tatuagem temporária como instrumento contra o assédio em BH
Mulheres usam tatuagem temporária como instrumento contra o assédio em BH (Paula Molina e Henrique Fernandes/Divulgação)
Mario Marques e Jose Antonio de Sousa Neto*
Durante o carnaval milhares de tatuagens descartáveis foram distribuídas com o dizer “não é não!”. A importância de poder dizer “não” e ser atendida é enfatizada pelos movimentos feministas todos os dias. Na verdade, esse é um direito de todos e deve ser sempre respeitado e reconhecido por lei em todas as circunstâncias, não apensa ao se recusar um beijo ou uma oferta sexual.
Uma característica das sociedades mais evoluídas está justamente relacionada ao direito de escolha que estas conferem aos seus cidadãos. De fato, as sociedades podem ser classificadas de boa a ruim, de acordo com o respeito que estas conferem ao direito dos indivíduos de dizer “não” àqueles que de alguma forma tentam impor suas vontades sobre a do outro.
O direito de dizer “não” se estende muito além dos domínios das feministas. Esse direito é, ou deveria ser, muito mais amplo. Sua importância se estende aos domínios da cidadania e à autonomia do indivíduo, sendo fundamental para à prosperidade econômica.
A liberdade econômica e o livre mercado têm como base os direitos iguais de consumidores e fornecedores de dizerem “não”. Nenhuma loja, indústria, restaurante, comercio em geral pode obrigá-lo a comprar o que estão ofertando/vendendo – justamente por seu direito de dizer “não” a qualquer oferta que eles fizerem. Para que um empresário tenha lucro lhe vendendo algo, ele deve fazer uma oferta que você aceite e diga “sim”. Precisa lhe convencer que a oferta é interessante. Seu direito de dizer “não” impede que o comerciante abuse ou lhe prejudique de alguma forma contra sua vontade. O seu “não” incentivará o empresário a melhorar a oferta, fazendo uma que seja mutuamente benéfica.
Por outro lado, você como comprador também não pode obrigar o comerciante a lhe vender o que você quer pelo preço que deseja pagar. O direito é mútuo de dizer “não”. Assim, para que haja uma compra e venda e você e o comerciante fechem negócio, você deve oferecer o pagamento de um valor que o vendedor considere interessante.
No livre mercado, o direito de dizer “não” é lei e as pessoas concordam apenas com as trocas que acreditam serem benéficas. As trocas (compras e vendas) no livre mercado não são operações de somatório zero, onde para um ganhar o outro tem que perder, mas sim de ganha-ganha, nas quais ambos o fazem por decisão e vontade própria. Esse fato é um dos motivos pelos quais os mercados mais livres são os mercados onde o crescimento econômico e o bem estar social ocorrem mais rapidamente.
O direito de dizer “não” também representa o mais justo direito de igualdade. Por maior e mais poderosa que seja uma empresa, ela é obrigada a convencer cada um de seus clientes a aceitarem suas ofertas e comprarem seus produtos e/ou serviços. Como os clientes têm o direito de recusar suas ofertas, simplesmente não comprando seus produtos, empresários devem encontrar maneiras de melhorar suas ofertas no intuito de convencer seus clientes a dizer “SIM’.
Tomemos como exemplo o bem-sucedido Luciano Hang o “Velho da Havan”. O trabalho dele é convencer seus clientes a dizerem “sim” diariamente e converter essas respostas em bons lucros para suas empresas. Mas e daí?
O direito dos indivíduos a dizer “não” motiva o empresário a selecionar, oferecer produtos e descobrir maneiras de atrair as pessoas às suas lojas e a dizerem “sim” comprando suas mercadorias e/ou serviços.
Devemos parabenizar esses empresários, em vez de lamentar ou invejar tal sucesso.
Além disso, embora Luciano Hang seja muito rico, no livre mercado seu poder de obrigar as pessoas a comprarem em suas empresas ou a fazerem negócios com ele permanece igual ao de qualquer outra pessoa por mais simples que seja: simplesmente nenhuma delas tem esse poder. A pessoa mais pobre pode dizer “não” a qualquer oferta do “velho da Havan”. Luciano Hang não tem poder sobre ela, assim como nenhum outro empresário ou cliente.
Da mesma forma o direito de dizer “não” também se aplica ao direito de um povo de dizer “não” àqueles que em princípio deveriam servir ao Estado através de suas instituições, mas que, no entendimento desde mesmo povo ao qual deveriam servir, comprometem gravemente o funcionamento das instituições democráticas. O clamor do “não” que estamos observando no Brasil em tempos recentes é por isso mesmo um “não” ataque às instituições e sim um “sim” a elas. Mas para que este “sim” possa ser ouvido e respeitado é preciso reafirmar a diversos agentes públicos que se apoderaram do estado brasileiro e que parecem se guiar por interesses sombrios e trevosos que “não é absolutamente não”.
* Mario Marques professor SKEMA Business School e participante dos grupos de iniciação científica da EMGE. Jose Antonio de Sousa Neto professor da EMGE.

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