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A produtora Elisa Tolomelli está otimista sobre o futuro do audiovisual no Brasil

 'O mercado hoje funciona diferente de cinco anos atrás, tem que se atualizar e evoluir'

Ana Paula Arósio em cena do filme 'A floresta que se move', produzido por Elisa
Ana Paula Arósio em cena do filme 'A floresta que se move', produzido por Elisa (EhFilmes/Divulgação)

Flávia Leão*

A pandemia causada pela Covid-19 e a consequente quarentena a que fomos submetidos recentemente revolucionou vários aspectos de nossas vidas, tanto pelo lado profissional como também a rotina e pequenos detalhes que alteram o dia a dia.

O campo do entretenimento, no qual se encontra o cinema e a TV, foi um dos mais afetados pelas normas de distanciamento social e restrições de vários tipos, obrigando produção, distribuição e exibição se reinventarem.

Palavras como streaming e VOD de repente tornaram-se costumeiras, e os filmes e séries de serviços como o da Netflix, Amazon Prime Video e Disney +, ajudaram a tornar os nossos dias de isolamento menos enfadonhos. Por outro lado, a produção de novelas, séries e cinema pararam ou tiveram que criar formas pouco convencionais de produção.

Para discutir um pouco os impactos da pandemia na área audiovisual, o Dom Total conversou com Elisa Tolomelli, fundadora há 30 anos, da Eh! Filmes, que se consolidou como uma das principais produtoras de cinema do país. Em seu currículo, Elisa assina a produção executiva de já clássicos como Central do Brasil e Cidade de Deus, além de ter comandado o lançamento de mais de 30 filmes. Nessa entrevista, ela conta um pouco sobre sua profissão e também expõe sua opinião sobre o futuro do audiovisual no Brasil e no mundo.

É fato que o produtor executivo tem uma função importantíssima na criação de uma obra audiovisual. Conte-nos um pouco como funciona o trabalho. Qual a melhor e a pior parte em sua opinião?

O produtor executivo é o braço direito do produtor. Cuida do planejamento, logística, controle do orçamento e prestação de contas da preparação e filmagem. A parte mais difícil é descobrir a melhor estratégia e logística dentro do orçamento existente - fazer o melhor filme possível dentro das limitações orçamentárias. A parte mais bacana é ir vencendo os desafios que cada filme nos apresenta.

Quando você entrou no curso de comunicação social, já tinha em mente a pós em cinema? Foi uma experiência boa?

Na verdade, não pensava em fazer cinema, eu me formei em publicidade, trabalhei como assistente de produção na área durante um tempo, depois entrei para o cinema e nunca mais saí. A pós-graduação veio muito depois, quando senti a necessidade de estudar mais sobre a atividade cinematográfica. Estudar é sempre bom, se atualizar, evoluir nos seus conhecimentos, aprofundar seu repertório.

Recentemente você está se aprofundando mais nas mídias sociais, com um canal no YouTube, com o curso “O produtor dos novos tempos”. Como está sendo essa experiência como professora e comunicadora e o retorno?

O retorno está um espetáculo e muito além das minhas expectativas iniciais. Para você ter uma ideia, com menos de três meses do canal, já temos mais de 1,5 mil seguidores e 152 mil visualizações nos vídeos! E estou gostando bastante da experiência de passar um pouco da minha experiência de 30 anos de profissão através da exibição de conteúdo gratuito para quem quer saber sobre como funcionam no mundo do audiovisual.

Acredita que o Brasil pode se consolidar como um grande produtor deaudiovisual? Como vê o futuro dessa área no país?

Acredito no futuro do audiovisual no Brasil e que a profissão de produtor audiovisual é o futuro. Aliás, não só a nossa profissão, mas de toda a cadeia de profissionais que trabalham no audiovisual, direta ou indiretamente. Porque 80% do tráfego da internet é consumo de audiovisual. Dos vídeos do Tik Tok, às super produções da Netflix, passando pela nova plataforma chamada Quibi. Porque o Brasil é o quinto país em consumo de conteúdo de internet. Porque é uma atividade que emprega, os profissionais ganham bem. Agora, precisamos capacitar nossa mão de obra pra fazer frente a esse mercado do futuro. E acredito que, com meus 30 anos de prática nessa profissão, posso contribuir nessa formação, e é esse o propósito do curso “O produtor dos novos tempos”.

Além do curso, existe outro projeto em que você esteja pensando para o futuro?

Sim, o próximo filme chamado Porto Caribe, que vou filmar no início do ano que vem.

No geral, como você entende a recepção dos filmes brasileiros no exterior?

É excelente. Estamos ganhando o mercado internacional a cada dia, com nossos curtas, documentários, filmes de ficção e de animação.

Em algum momento você já cogitou fazer carreira fora do Brasil?

Não. Meu lugar é aqui.

Você trabalhou com o Fernando Meirelles em Cidade de Deus. Como foi a experiência?

Foi muito gratificante. Fizemos uma linda parceria. O Fernando é um diretor que sabe o que quer, sabe contar uma história, cinematograficamente falando. Sabe quanto custa uma ideia, é um diretor generoso, que sabe ouvir. É muito bom trabalhar com ele.

Recentemente foi anunciado que a produção Mulan será lançada diretamente em streaming, em razão da pandemia. Qual a sua opinião sobre o futuro do audiovisual depois de 2020 e da pandemia?

O streaming chegou pra ficar. É uma realidade e não uma ameaça. Não acredito que vá “acabar com o cinema”, pelo contrário, veio pra somar, pra aumentar o potencial do mercado audiovisual, injetando recursos privados na economia, gerando empregos, sendo uma outra janela de exibição para o nosso conteúdo. Cada vez mais essas janelas de exibição irão se misturar, irão se somar, nos dando opções de diferentes formas de lançamento para nosso produto cultural.

A produção audiovisual brasileira específica para streaming tem crescido bastante, em parceria com as plataformas. Como funciona a captação de recursos para esse tipo de produção?

Se você tem um projeto de telefilme ou de série, você precisa encontrar um canal ou plataforma digital que tenha o perfil do seu projeto, e apresentar seu produto a eles. Se eles gostam, vão investir no roteiro e na produção da série como um todo.

O produtor executivo exerce um trabalho central com toda a equipe e tem que lidar constantemente com o diretor. Como foi sua experiência com diretores?

Algumas relações foram mais harmoniosas que outras. Mas o importante a dizer hoje é que a forma de se produzir e de se consumir conteúdo audiovisual mudou e está em permanente evolução, e assim como existe o “produtor dos novos tempos”, que tem que se atualizar e evoluir com o mercado como atualmente se apresenta, isso também vale  para diretores e roteiristas, que precisam fazer o mesmo, pois o mercado hoje funciona diferente de cinco anos atrás. E nem é tanto tempo assim. E a relação entre produtor e diretor também precisa se adequar aos novos tempos.

Como é exercer essa profissão sendo mulher?

Nunca tive problemas em me firmar no mercado por ser mulher. O audiovisual tem um número enorme de mulheres, em todas as funções. Na minha área existem excelentes produtoras, ganhadoras de prêmios e conquistadoras de bilheteria.

Qual o seu conselho para mulheres que sonham atuar nesse universo, mas que se deixam intimidar pelos desafios?

Desafios elas terão em qualquer profissão. Precisa ser guerreira de qualquer forma. O conselho é: independentemente de sua profissão, encare os desafios que a vida lhe apresenta, você é capaz de vencê-los.

Tem um filme ou série favorito?

Depende da fase. Atualmente, Grey’s Annatomy, que adoro e vi as 15 temporadas durante a pandemia, e os filmes The gold guardian e Dois papas.


Dom Total

Flávia Leão é jornalista, crítica de cinema do Dom Total.

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